Arquidiocese de Braga -

4 setembro 2015

Visita "ad limina": o regresso "às fontes"

Fotografia DACS

Bispos portugueses já chegaram a Roma para encontro e comunhão com o Sumo Pontífice. Última visita ocorreu em 2007, durante o pontificado de Bento XVI.

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O final do ano de 2015 será marcado por inúmeras actividades pastorais. 

Em Outubro decorre o Sínodo da Família, mas antes disso ainda tem lugar a visita dos bispos portugueses a Roma.
A última visita ad limina foi há oito anos com o Papa Bento XVI.
Agora o Papa Francisco recebe no Vaticano os representantes das dioceses de Portugal. O que mudou no pais desde 2007? Como está a Igreja a exercer a sua acção pastoral? O que podem os fiéis esperar desta visita?


O que é uma visita “ad limina”?

A visita ad sacra limina apostolorum ou visita ad limina é realizada pelos bispos do mundo inteiro. Os prelados viajam até Roma com o objectivo de reforçarem as suas responsabilidades de “sucessores dos apóstolos” e a comunhão com o sucessor de S. Pedro. Um dos momentos altos da passagem por Roma é a visita aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo: trata-se de uma espécie de regresso às origens que pretende aproximar ainda mais os bispos do carisma inicial da Igreja.

Segundo o Código de Direito Canónico, a visita é de carácter obrigatório: de cinco em cinco anos, os bispos devem ver o Papa e apresentar um relatório informativo sobre a vida das suas dioceses, de forma a permitir ao Sumo Pontífice perceber as diferentes dinâmicas associadas a cada localidade.

Mas este encontro não se reveste apenas de obrigatoriedade: os bispos também encontram na visita uma oportunidade para demonstrar obediência e afecto ao Santo Padre, que lhes responde com igual estima, fornecendo os conselhos e directrizes necessários às suas dioceses e à sua missão enquanto bispos. 

Todos os anos, até meados de Março, é enviado para Roma um relatório estatístico que informa a Cúria sobre os dados mais relevantes da vida diocesana: o número de casamentos, funerais e baptizados celebrados ou o número de seminaristas e sacerdotes são alguns dos dados apresentados. Em ano de visita ad limina, como é o caso de 2015, o relatório é aprofundado e tem de chegar à Santa Sé pelo menos seis meses antes da visita ao Papa. Análises sociológicas, o plano pastoral da diocese, informações sobre o funcionamento dos seus departamentos e dados relacionados com os movimentos religiosos, congregações e comissões da diocese constam do documento, de forma detalhada.

É a partir deste grande relatório, elaborado tradicionalmente de cinco em cinco anos, que o Vaticano propõe as suas  orientações, de forma a corrigir possíveis problemas ou a melhorar aspectos pastorais ou estruturais.

Cada visita – cuja organização fica a cargo do Núncio Apostólico de cada país, da Congregação para os Bispos e da Conferência Episcopal – aporta grande preparação: além do desenvolvimento do relatório quinquenal, muitas são as reflexões e orações que antecedem a viagem até Roma. 

As advertências de Bento XVI

No dia 7 de Setembro, logo pela manhã, os bispos das províncias eclesiásticas de Lisboa e de Évora reúnem-se com o Papa Francisco. Duas horas depois, são recebidos os bispos da província eclesiástica de Braga. Durante os encontros, Bergoglio fará um discurso baseado no grande relatório que a Santa Sé recebeu, seis meses antes, por parte da Igreja portuguesa e no qual é descrita a situação particular de cada diocese.

Durante a última visita ad limina dos bispos portugueses, ainda durante o pontificado de Bento XVI, foram vários os desafios propostos pelo Papa Emérito ao episcopado português. A desertificação das paróquias do interior foi um dos temas-chave: o Santo Padre pediu alterações à pastoral portuguesa tendo em conta a nova conjuntura demográfica. Ratzinger sublinhou também a necessidade de avaliar “a eficácia dos percursos de iniciação cristã”, bem como “mudar o estilo de organização da comunidade eclesial portuguesa e a mentalidade dos seus membros para se ter uma Igreja ao ritmo do Concílio Vaticano II”. Em 2010, depois da visita apostólica de Bento XVI a Portugal, a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), no sentido de responder às solicitações do Papa, lançou o programa “Repensar Juntos a Pastoral da Igreja em Portugal”. 

“O programa em que a nossa Igreja está empenhada deverá ter sempre presente as mensagens que o Santo Padre nos deixou, como fonte de inspiração, como incentivo e norma de acção”, pode ler-se no comunicado da Assembleia Plenária Extraordinária da CEP. No instrumento de trabalho que serve de base ao programa, a Conferência sublinha a necessidade de “encontrar uma compreensão comum a todas as Igrejas de Portugal dos caminhos da missão e enunciar prioridades de opções e dinâmicas de acção com as quais todas as dioceses se comprometam”, à luz das perspectivas avançadas pelo Concílio Vaticano II. No documento são também elencados os aspectos que parecem indispensáveis a uma nova forma de “ser igreja” tendo em conta os contextos em que se encontra inserido Portugal: uma maior exigência a nível de formação cristã, o empenho na nova evangelização e a reorganização das comunidades cristãs à luz de novas formas de exercício do ministério sacerdotal.

No seguimento do programa, em Abril de 2012, a CEP apresentou em Fátima o estudo “Identidades Religiosas em Portugal: representações, valores e práticas”, que deu conta de uma diminuição do número de católicos. De acordo com o inquérito elaborado pela Universidade Católica Portuguesa (UCP) entre 1999 e 2011, enquanto a percentagem de católicos baixou de 86,9% para 79,5%, o número daqueles que se afirmaram não crentes ou sem religião aumentou em 6%.

Um ano depois, a Conferência aprovou, após “um amplo movimento de auscultação junto do Povo de Deus”, o documento “Promover a Renovação da Pastoral da Igreja em Portugal”. Nele são novamente indicados os rumos a seguir com vista a uma Igreja dinâmica, fraterna, participativa e vigilante. 

Todas estas intenções têm encontrado dificuldades ao nível da sua concretização. Oito anos depois da última visita ad limina, D. Manuel Clemente, presidente da CEP, revelou, em entrevista à Agência Ecclesia, que a visita deste ano vai retomar o documento “Promover a Renovação da Pastoral da Igreja em Portugal” e o tema da “iniciação cristã”. O patriarca de Lisboa também confirmou que ainda há muito trabalho a fazer para concretizar os desafios de Bento XVI. 


Os temas

Até ao dia 12 de Setembro, os bispos vão estar divididos por grupos consoante a sua área de trabalho habitual na Conferência Episcopal. Cada grupo encontra-se separado no respectivo dicastério, com o intuito de apresentar e debater a actual situação de Portugal. 

As questões em cima da mesa não incidem só nos temas religiosos e estruturais da Igreja. O debate estende-se a outros aspectos, até porque a Conferência Episcopal abrange comissões e secretariados específicos.

O Arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga, preside à Comissão da Pastoral Social e Mobilidade Humana. Como tal, não será de estranhar que este grupo aborde questões sociais e económicas e a acção social da Igreja. Temas como o desemprego, a precariedade 

e as consequências que daí advêm  - como a quebra de natalidade - também foram incluídos no relatório enviado para a Santa Sé e, como tal, serão debatidos. A meio da semana, na quarta-feira, os bispos portugueses voltam a encontrar-se com o Papa Francisco na audiência geral.

Mais para o final do ano, em Novembro, os bispos reúnem-se em Fátima, na habitual reunião da Conferência Episcopal, para debater os resultados das reuniões

no Vaticano. Antes disso, em Outubro, arranca em Roma o Sínodo da Família, onde os bispos terão oportunidade de se pronunciar sobre temas polémicos, como o acolhimento de divorciados e homossexuais por parte da Igreja. Outro aspecto que não deve ser ignorado é o momento em que acontece a visita. Portugal estará em altura de pré-campanha eleitoral, pelo que temas como a economia ou política também serão escrutinados durante o encontro. Estes são, aliás, dois assuntos que têm marcado os discursos e o pontificado de Francisco. Apesar de o Sumo Pontífice considerar que a Igreja deve distanciar-se de ideologias e tendências políticas, também já afirmou que o Evangelho deve operar em todas as situações, mesmo nas “mais hostis e afastadas da Igreja”.