Arquidiocese de Braga -

21 julho 2013

SACERDOTES AO ESTILO CONCILIAR

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Homilia nas Ordenações Presbiterais

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Sacerdotes ao estilo conciliar

Homilia nas Ordenações Presbiterais

 

1. Experiência humana

Durante a vida presbiteral, há um conjunto de sentenças do “tribunal popular” às quais estamos sujeitos. Por isso, permiti que enumere algumas:

- Se um padre prega durante mais de dez minutos, é um chato.
Mas se prega em menos de dez minutos, é um apressado.

- Se aborda temas sociais, é porque se quer meter na política.
E se só aborda temas religiosos, erra por não se estar a comprometer com o mundo.

- Se aparece com o cabelo comprido, é revolucionário.
E se usa o cabelo curto, é antiquado.

- Se é exigente pastoralmente, afasta as pessoas da Igreja.
Se está na igreja, devia sair para visitar os paroquianos.
E se os visita, nunca está na igreja para os acolher.

- Se não convive, é introvertido.
Se promove convívios, só pensa em festas.
E se quer moralizar as festas, está a acabar com a religião do povo.

- Se se mete em obras na igreja, gasta dinheiro desnecessariamente.
E se não faz as necessárias obras de restauro, é porque é um grande desleixado.

- Se apresenta publicamente as contas da paróquia, é um pedinte. Se não as apresenta, é um ladrão.   Se não as apresenta, é um ladrão.

- Se dirige a paróquia sozinho, é um autoritário
Se exorta à colaboração dos leigos, deixa-se influenciar.

- Se é jovem, falta-lhe experiência.
E se é idoso, deveria reformar-se.
- Mas… quando o padre vai embora ou morre,

só aí as pessoas reparam que ele era realmente insubstituível.

 

2. Liturgia da Palavra

Partindo deste jogral, no evangelho de hoje Jesus depara-se com uma situação idêntica. Por um lado, se Marta está focada no trabalho doméstico que competia às mulheres, é porque é uma má discípula que não escuta o seu Mestre. E por outro lado, se Maria está focada na escuta do Mestre, é porque não está a cumprir eventualmente o seu trabalho doméstico.

Diante deste cenário e da pergunta reivindicatória de Marta, Jesus não a critica mas ajuda-a a compreender a situação. O problema de Marta não está na eventual preguiça de sua irmã Maria, mas na sua falta de organização com tanto serviço. Por isso, ela sente-se pressionada em acabar rapidamente o seu serviço doméstico, para depois sentar-se ao lado da sua irmã para escutar as sábias palavras de Jesus.

 

3. Desafios pastorais

Com base na figura de Marta, um dos maiores erros que nós, sacerdotes, podemos cometer na actualidade é o denominado activismo pastoral, como já referiu várias vezes o Papa Francisco. Por vezes, gostamos de atestar os nossos programas pastorais com inúmeras datas de actividades, só que corremos o risco de cometer o pecado de Marta, ou seja: não ter capacidade de executar atempadamente o planeado e depois desculparmo-nos com a crítica alheia, começando por perder a tranquilidade indispensável a um serviço pastoral com qualidade.

Identificado este problema pastoral, considero que há um critério que poderá evitá-lo no futuro: a virtude da obediência[1], entendida como serena adesão à vontade de Deus e confiante entrega ao que Deus pretende de nós. Uma virtude que, considero, podemos vivê-la em quatro dimensões: a obediência ao Sacramento da Ordem (como refere o documento conciliar Sacrossanctum Concilium), na fidelidade às promessas sacerdotais; à Palavra de Deus (Dei Verbum), no deixar-se evangelizar pela Palavra; à Hierarquia da Igreja (Lumen Gentium), na alegria de pertencer a uma Igreja-comunhão; e aos sinais dos tempos (Gaudium et Spes), numa capacidade de auscultar o mundo nas suas alegrias e anseios.

Ao celebrarmos o Ano da Fé, como jubileu do Concílio Vaticano II, não temos outra hipótese senão redescobrirmos a nossa identidade conciliar. Se é verdade que “a messe é grande e os operários são poucos”, só nos resta começar pelo essencial que é a fé, sem medo da crítica e do confronto intelectual. O mundo espera de nós uma mensagem diferente, nitidamente marcada pela fé que exige muita coragem.

Por isso, não posso deixar de solicitar a todo o presbitério, e por estes a todos os cristãos, que sejamos capazes duma verdadeira experiência de fé, como gosto de estar com Jesus para acolher o Seu Amor, como a pérola preciosa a dar sentido à existência quotidiana, ou seja: obedecer-Lhe para obedecer aos outros. Aliás, o número 37 da Lumen Fidei refere que “quem se abriu ao amor de Deus, acolheu a Sua voz e recebeu a Sua luz, não pode guardar este dom para si mesmo. Uma vez que é escuta e visão, a fé transmite-se também como palavra e como luz.”

4. Ano Litúrgico

Neste sentido, em breve iniciaremos o Ano Litúrgico na nossa Arquidiocese. Trata-se de uma oportunidade de pegar na fé que foi professada durante este ano e coloca-la na liturgia para ser dignamente celebrada. E porquê? Pois como refere o n.º 10 da Sacrossanctum Concilium: “a Liturgia é simultaneamente a meta para a qual se encaminha a acção da Igreja e a fonte de onde promana toda a sua força.”

Uma fé que obedece e confia em Deus, deve aceitar o nosso Programa Pastoral sobre a fé celebrada, como único caminho a seguir por todas as comunidades. Ousaremos fazê-lo? Assim Deus nos ajude!

 

 

5. Agradecimento

Para terminar, gostaria de louvar o Senhor pela vocação do Abílio, do Nuno, do Dayakar e do Eduardo, este último da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus (Dehonianos), bem como agradecer aos seus pais o dom da vida; agradecer às comunidades de origem a oração pelas vocações; agradecer aos Seminários a formação concedida; agradecer às comunidades de estágio a maturidade implementada; e agradecer-vos a coragem em aceitares este desafio sacerdotal. Além disso, desculpai-me a ousadia, mas gostaria de vos lançar já hoje um primeiro desafio: sede alegres no vossos ministério e conquistai o coração de outros jovens para que não tenham medo de seguir Jesus!

 

+ Jorge Ortiga, A.P.

Cripta do Sameiro, 21 de Julho de 2013.



[1] Cf. D. Jorge Ortiga, As 7 maravilhas do sacerdócio. Homilia da Missa Crismal – Quinta-Feira Santa 2012.