Arquidiocese de Braga -

20 setembro 2013

UM PATRIMÓNIO PRIVADO, MAS AO SERVIÇO DE TODOS!

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Discurso na sessão solene do Dia do Património das Misericórdias, em Braga.

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Um património privado mas ao serviço de todos

É bom ter um “Dia do Património das Misericórdias”. É oportunidade para sublinhar um dado inquestionável. O património das Misericórdia, assim como todo o património da Igreja, tem uma origem e uma finalidade muito precisa.

Como origem, emana duma comunidade crente que, exprimindo a fé, partilha os seus bens para que a Igreja exerça a sua missão, porque bem sabemos que, apesar de passarmos a vida a ouvir dizer que Deus é perfeito, contudo Ele também tem um grande “defeito”: é que Ele, embora ame todas as pessoas, tem um fraquinho e um carinho especial pelos mais pobres, marginalizados e abandonados da sociedade.  

Por isso, a multisecular história das Misericórdias confirma esta constatação de ter de proteger e cuidar de um vasto património, financiado pela fé cristã das pessoas. Trata-se, sem dúvida, de um património antigo e moderno, não só do âmbito social mas também do artístico. Sempre defendemos que este património integre uma rede nacional (ou local) que o divulgue e valorize, mas que nunca perca a sua propriedade e, sobretudo, identidade eclesial.

O património artístico da Igreja encerra um valor incomensurável. Foi a história de uma cultura que o edificou e, por isso, hoje torna-se numa alavanca para o denominado turismo religioso, sobre o qual até o próprio Governo vê neste tipo de turismo uma fonte de receita a potenciar para o PIB português. Contudo, é importante não esquecer que este tipo de turismo provém de uma cultura religiosa própria (católica), que o gerou e o suporta, pelo que o Estado laico não pode deixar de concretizar o princípio da Concordata, que sublinha a separação e reconhece a obrigação de colaboração, tendo sempre em vista o bem comum.

Com isto, quero apenas realçar a importância deste Dia do Património como um momento oportuno para que haja um diálogo frutífero entre a Igreja, o Estado e o poder local acerca deste assunto. Porque, acima de tudo, a Igreja deseja abrir as suas portas à sociedade, e o Estado, bem como o poder local, devem olhar para ela, não como uma adversária, mas como uma aliada na edificação desse bem-comum.

Partindo destas observações iniciais, há dias num debate autárquico entre os cinco candidatos à Câmara Municipal de Braga, mediante a pergunta sobre o património e a acção social, nenhum deles fez sequer referência ao contributo da Igreja nestas áreas. Obviamente que não pretendemos medalhas ou capas de jornais pela acção social (e pelo património) que desenvolvemos, uma vez que preferimos a política do silêncio ao estilo de Jesus Cristo: ou seja, ajudar sem fazer grande publicidade. A Igreja e as suas instituições só pretende colaborar na construção duma sociedade mais justa através dum diálogo transparente e repleto dum sincero desejo de tudo fazer para o bem-comum.

Mas não referir o papel da Igreja nesta área, pode significar duas coisas: ou ainda vêem a Igreja como uma adversária social, ou então não conhecem minimamente a realidade municipal da acção social e do esforço que a Igreja em Braga faz para cuidar do Património. Acredito que tenha sido por esquecimento esta omissão, mas por vezes interrogo se não é uma mentalidade que se vai impondo no país.

Aliás, se a Igreja Católica recebeu recentemente da Assembleia da República o prémio “Direitos Humanos”, é a prova de que a sua acção tem qualidade e que pode colmatar as eventuais ineficácias dos deveres do Estado, pois como muitos reconhecem na comunicação social: “se a Igreja parasse, a situação social seria um descalabro.” [1]

Que este Dia do Património das Misericórdias permita para elas, e para todas as outras instituições eclesiais, uma oportunidade para continuar a oferecer à sociedade o nosso contributo sem complexos, na certeza de um trabalho incansável das comunidades e instituições cristãs com competência e generosidade.

O nosso património, embora seja de propriedade privada, queremos que ele esteja sempre ao serviço do bem-comum. Por isso, precisamos da colaboração do Estado e das Autarquias, que gerem os dinheiros públicos, para que possamos proteger, cuidar e dispor deste património ao público com qualidade, quer no âmbito artístico quer no âmbito da acção social.

+ Jorge Ortiga, A.P.

Auditório S. Marcos (Braga), 20 de Setembro de 2013.



[1] Igreja Viva (Suplemento do Jornal Diário do Minho), 29 de Novembro de 2012, 1.