Arquidiocese de Braga -
13 abril 2025
Folhas de peregrinação

Homilia de D. José Cordeiro - Domingo de Ramos na Paixão do Senhor, 13 abril 2025
1.Uma palavra de alento
O profeta Isaías, na primeira leitura desta liturgia, refere-se ao servo sofredor de Javé, que se realiza em Jesus e que vem «dizer uma palavra de alento aos que andam abatidos». Pois, «todas as manhãs Ele desperta os meus ouvidos, para eu escutar, como escutam os discípulos».
A inteira Semana Santa é uma ocasião preciosa para começar de novo. Em que sentido? «Naturalmente para o princípio que sempre foi proposto e vivido, para Jesus Cristo, ontem, hoje e em toda a eternidade, para a sua graça, a única que salva e que nos abre a porta para o Deus vivo» (K. Rahner).
Peregrinar na Esperança é um caminho para um encontro vivo com Jesus Cristo. Eu sou cristão por atração. Na cruz de Jesus está a força de atração. Acreditar é deixar-se atrair na vertical e na horizontal. Há um texto de Goethe que sublinha isto mesmo: «acreditar ou não acreditar: essa é a questão mais profunda na história do mundo, a única e verdadeira questão, e a mais importante de todas».
2.Atravessar a Porta
Os ramos que trazemos conosco e foram benzidos com água que nos evoca o Batismo, convidam-nos a prosseguirmos a peregrinação de esperança. As inúmeras folhas de oliveira, que usamos no expressivo costume litúrgico de Braga da semana santa em frente da porta da Sé primaz, simbolizam o nosso encontro com o Evangelho, a fidelidade e paz do coração.
Em muitos lugares, por exemplo em mosteiros, as pessoas levam os ramos de oliveira benzidos para casa e colocam-nos em alguns compartimentos junto a uma imagem de Jesus, como o crucifixo, para recordar que ser cristão é seguir Jesus e configurar-se a Ele.
A força simbólica da travessia da porta da Sé recorda de imediato as palavras de Jesus: «Eu sou a porta, se alguém entrar por Mim, será salvo» (Jo 10,9). Cristo é a passagem do ser humano para Deus. Por isso, passar a porta da Igreja está cheia de significados e compromissos humanos, sociais, culturais, pastorais, espirituais, sinodais e missionários.
Uma porta é, por um lado, uma realidade que fecha e separa dois lugares; e, por outro lado, que abre e mete em relação e comunicação. Tem além da sua função prática este apelo de passagem, da condição de peregrinos à de contemplativos. A porta é assim uma meta, o termo de uma etapa de um processo de conversão: passar desta vida à vida eterna, da condição de pecador à salvação.
Por isso, atravessamos as portas da Sé Primaz, com o rito peculiar bracarense de a abrir com a Cruz de Jesus Cristo. Na verdade: «a porta da fé (cf. At 14, 27), que introduz na vida de comunhão com Deus e permite a entrada na sua Igreja, está sempre aberta para nós. É possível cruzar este limiar, quando a Palavra de Deus é anunciada e o coração se deixa plasmar pela graça que transforma. Atravessar esta porta implica embrenhar-se num caminho que dura a vida inteira. Este caminho tem início no Batismo (cf. Rm 6, 4), pelo qual podemos dirigir-nos a Deus com o nome de Pai, e está concluído com a passagem através da morte para a vida eterna, fruto da ressurreição do Senhor Jesus, que, com o dom do Espírito Santo, quis fazer participantes da sua própria glória quantos creem n’Ele (cf. Jo 17, 22)» (Bento XVI).
3.Comer esta Páscoa convosco
As palavras de Jesus antes da última ceia, e consequentemente, antes da sua paixão e morte: «desejei ardentemente comer esta Páscoa convosco, antes de padecer» (Lc 22, 15), atualizam-se no hoje da história da salvação e realçam-se na soleira da Semana Santa ou Semana Maior.
Jesus deixou-se pregar numa cruz, como a maior prova do amor de Deus por nós, «mas, antes de estender os braços entre o céu e a terra, como sinal indelével da vossa aliança quis celebrar a Páscoa com os seus discípulos» (Oração Eucarística da Reconciliação I).
Na carta apostólica Desiderio desideravi, sobre a formação litúrgica do povo de Deus, o Papa Francisco afirma: «o conteúdo do Pão partido é a cruz de Jesus, o seu sacrifício em obediência de amor ao Pai». É disto mesmo que fazemos memória em cada celebração da Eucaristia, o tesouro mais precioso da Igreja.
Jesus sabe que é Ele a Páscoa: «esta é a novidade absoluta daquela Ceia, a única verdadeira novidade da história, que torna aquela Ceia única e, por isso, “última”, irrepetível».
A celebração da liturgia e as expressões da piedade popular tão assinaladas nestes dias encorajem e envolvam ainda mais as comunidades cristãs nos sinais da peregrinação de esperança: a paz, a vida, o diálogo, o perdão, a família, a dignidade no trabalho, as pessoas com deficiência, os cuidados continuados, os cuidados paliativos, as vítimas de todos os abusos, os presos, os doentes, os jovens, os migrantes, os idosos, os pobres, o bem-comum.
A Semana Santa, que iniciamos, seja um grande caminho de Páscoa para toda a humanidade. As igrejas estejam de portas abertas e se revalorize a adoração eucarística, aqui na cidade bracarense e na arquidiocese, como está pouco a pouco a acontecer.
+ José Manuel Cordeiro
Partilhar