Arquidiocese de Braga -

16 dezembro 2012

O PARADOXO DA DEMOCRACIA

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Homilia na celebração da Bênção das Grávidas.

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O paradoxo da democracia

Homilia na Bênção das Grávidas

 

Quando a democracia é operada por políticos sem vocação para tal, chegamos ao cúmulo de ter leis paradoxais: por um lado, o aborto que possibilita a morte de inocentes; por outro lado, benefícios fiscais e atractivos económicos para fazer aumentar a taxa de natalidade e evitar o envelhecimento do país, com receio de um colapso na Segurança Social. Partindo deste pressuposto, nós católicos preferimos defender sempre a vida! Trata-se de uma opção humanamente racional e de uma exigência do Deus Criador.

Deste modo, queremos este ano reintroduzir uma festa do Rito Bracarense que remonta a tempos muito antigos. Sabemos que Nossa Senhora marca muito a liturgia bracarense e a piedade popular é particularmente mariana. Neste espírito, o Missal Bracarense coloca a celebração da Festa de Nª Senhora do Ó (ou da Expectação) sete dias antes do Natal, ou seja, a 18 de Dezembro. Movidos por este espírito e em diálogo com a Pastoral Familiar, gostaria que, na Sé Catedral, o IV Domingo do Advento contemplasse sempre a Bênção das Grávidas. Trata-se dum gesto de preparação natalícia, situando-nos na figura de Maria, como aquela que melhor viveu o espirito do Advento.

Esta cerimónia reveste-se dum significado muito especial neste tempo de diminuição da natalidade num sério risco de perturbação etária da população com incidência no futuro que não está a ser devidamente pensadas. Se encontramos neste aspeto uma dimensão social importante, não podemos esquecer a dimensão religiosa de amor à vida como dom de Deus a acolher nos casais numa expressão profunda de amor. Se outrora que sublinhava quase exclusivamente a função criativa da vida familiar, hoje pretende-se que o amor se encerre no casal. Os filhos tornam-se um fardo e um impedimento à felicidade. Importa viver a vida sem condicionalismos e constrangimentos.

Houve um tempo em que Portugal levou esta devoção muito longe. Para mim, foi marcante o momento em que subi ao monte onde, segunda a tradição, terá sido martirizado e sepultado S. Tomé, em Meliapor, na Índia, e aí encontrei uma capela, de características portuguesas, onde se encontra escrito: “Nª Srª da Expetação”. Momento que nunca esquecerei.

Esta cerimónia, não tem somente uma motivação interpelativa à maternidade em termos de recordação duma devoção quase devotada ao esquecimento. S. Paulo, na segunda leitura, apresenta-nos razões que nunca deveríamos esquecer:

 

1 – Em primeiro lugar a Maternidade acontece como momento e experiência única duma alegria que dificilmente se pode explicar. Não é um mero dado fisiológico. O crente, por seu turno, e em Ano da Fé, coloca-o noutro âmbito. “Exultai de alegria”, convidava-nos o salmista. Vós, caríssimas mães, sentis a alegria pela maravilha que Deus permite ser realizada em vós. Encarai a experiência e vivei os possíveis desconfortos, antes e depois da maternidade, na alegria. Dizem que faltam razões para viver alegres. Uma criança a nascer é o encanto duma vida nova que justifica todos os sacrifícios, em sinal do sacrifício primitivo da criação. A propósito, no dia do funeral do seu filho, Helena Sacadura Cabral afirmava: "Os filhos são apenas um empréstimo de Deus".

               

2 – Na alegria ultrapassam-se todas as dúvidas e perplexidades. Por isso S. Paulo recorda: “Não vos inquieteis com coisa alguma”. Fazei a vossa parte e confiai em todos os momentos. Conheço dramas no nascimento e na vida das crianças. Só que Deus dá coragem para acreditar e confia à Igreja esta responsabilidade de acolher a vida. Madre Teresa de Calcutá, a santa apaixonada pelos mais frágeis, dizia que “se as mães não quisessem os filhos que os entregassem”. Também hoje, Deus não permite a inquietação pois confia à Igreja o trabalho que os bebés ou crianças possam oferecer.

E como se lê no ritual do Matrimónio, os casais devem gerar filhos para o mundo, enriquecendo o Povo de Deus, ao contrário do que defendem algumas seitas religiosas.

 

3 – Hoje e aqui, mas sempre na vossa vida, habituai-vos a apresentar os vossos pedidos diante de Deus com orações, súplicas e ações de graça. A Fé é abandono em Deus e não solução mágica dos problemas. Normalmente, só vemos Deus para pedir, e esquecemos a atitude de dar graças por tantas coisas maravilhosas que os filhos, mesmo com os encargos materiais ou os trabalhos especiais por possíveis deficiências, oferecem! Como é encantador ouvir os pais falar das alegrias que os filhos lhe proporcionam!

 

4 – “A paz de Deus” estará nos pensamentos e na memória diária. A paz é sinónimo de felicidade que se vai experimentando. Não somos ingénuos até ao ponto de pensar que os filhos são sempre motivo de consolação. Quantos enigmas encontramos no dia-a-dia. Mas, ao mesmo tempo, quando os pais sabem estar no seu lugar e não se demitem do seu dever, mesmo com lágrimas nos olhos, experimentam a interioridade duma vida indescritível de felicidade.

 

Para terminar, a gravidez é assim o sinal por excelência da proximidade do Messias e do cumprimento da promessa divina. Se Sara, a mulher estéril, sorriu com o nascimento do seu filho, façamos do sorriso o melhor testemunho da nossa fé em Deus, tal como propus na Mensagem para este Tempo de Advento, e a melhor arma para desautorizar a lei do aborto, porque, quer queiramos quer não, vale mesmo a pena viver!

 

+ Jorge Ortiga, A. P.

16 de Dezembro de 2012, Sé Catedral de Braga.