Arquidiocese de Braga -

6 janeiro 2013

UMA PEDAGOGIA MARIANA

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Homilia na Eucaristia da Tomada de Posse dos Conselhos Económicos Paroquiais.

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Uma pedagogia mariana

Homilia na eucaristia solene de acção de graças pelas bodas episcopais

 

Um filho

Com a noite de passagem de ano, um canal televisivo produziu mais um ídolo social, através de programas sensacionalistas e, por vezes, ofensivos à liberdade religiosa. Porém, eu hoje estou aqui para vos falar de um outro “ídolo”: o Menino Jesus. Uma criança que não teve que dar provas das suas capacidades nem estar sujeito à eleição popular, mas que, misteriosamente, foi enviado por Deus aos Homens, como escutávamos na Carta de Paulo aos Efésios.

Contra todas os prognósticos, rapidamente atingiu uma notoriedade social pelo que vieram de propósito uns magos do Oriente para O ver, como nos relata o evangelho. Três reis magos, cuja tradição cristã, afirma que vieram de três locais diferentes (África, Ásia e Europa), que eram de três raças diferentes (amarela, negra e branca), que tinham três idades diferentes (jovem, adulto e idoso) e que quiseram oferecer-lhe três presentes diferentes: ouro, como forma de reconhecerem a sua realeza; incenso, como forma de reconhecerem a sua divindade; e mirra, como forma de reconhecerem a sua humanidade.

 

Uma educadora

Se o encontraram, foi por causa duma mulher excepcional: Maria. E se estamos aqui, oriundos de quase todas as paróquias, através dos Conselhos Económicos, queria lembrar e reconhecer o grande amor do nosso povo a Maria. Por isso, quero percorrer todos os Santuários Marianos dos nossos arciprestados, para aí colocar as dores e as tristezas de quantos aí vivem: N. S. da Abadia, N. S. da Franqueira, N. S. da Aparecida, N. S. do Facho, N. S. do Socorro, N. S. da Saúde, N. S. do Viso, N. S. da Guia, N. S. de Antime, N. S. das Neves, N. S. da Lapinha, N. S. do Carmo da Penha, N. S. do Pilar, N. S. de Porto d’Ave, N. S. da Fé, N. S. da Saúde, N. S. do Carmo, N. S. do Bom Despacho e N. S. do Alívio.  Que Maria a todos acompanhe na árdua tarefa de construir uma vida digna.

Porém, ao celebrar hoje com a toda a Arquidiocese as minhas bodas de prata episcopais, neste belo Santuário Arquidiocesano de Nossa Senhora do Sameiro, gostaria de centrar a minha reflexão no maior presente que Maria ofereceu ao Menino Jesus, e que através de nós gostaria de oferecer a inúmeros jovens: uma educação de qualidade. A tarefa não era fácil, pois ela tinha diante de si a criança mais sobredotada da humanidade. Além disso, ela não tinha apoio psicológico nem suporte familiar e, como se não bastasse, o Anjo Gabriel tinha-se esquecido de lhe dar o manual de instruções.

Mas mesmo assim, as poucas reacções de Maria descritas no Evangelho revelam que ela tinha uma profunda capacidade pedagógica de reflexão, onde muitas vezes o silêncio substituía as respostas automáticas.[1] A sua paciência intuitiva foi o segredo da sua educação, porque quem não tem paciência para educar, pode estar preparado para trabalhar com máquinas, mas não com pessoas.

De facto, o seu silêncio intelectual tornou-se evidente na hospedaria de Belém, no caminho do Egipto, nas bodas de Canãa, na estrada de Jerusalém e no alto do Calvário. Por tudo isto, o Concílio Vaticano II, no n.º 53 da Lumen Gentium, “saúda-a como membro supereminente e absolutamente singular da Igreja, e também como seu exemplar modelo acabado na fé e na caridade”.

Sim, Maria, é o nosso modelo na fé e com ela devemos reconhecer que a educação só é verdadeira quando integra a fé que é professada, celebrada, vivida, anunciada e comtemplada.

 

Uma Igreja

Na árdua missão de redescobrir o tesouro do mesmo Concílio, durante este Ano da Fé[2], Maria, aceitemos esta grande verdade, apresenta-se como um modelo pedagógico a seguir na Igreja, de modo a redescobrirmos a nossa identidade cristã[3].

                A missão de uma paróquia visa promover a catequese, liturgia e caridade cristã. Com Maria, concluímos que uma catequese fundada na Palavra de Deus, provoca uma melhor compreensão e participação nos actos litúrgicos e, por conseguinte, uma desprendida acção caritativa junto dos mais necessitados. A partir da vida de Maria, queremos renovar a paróquia, sabendo, que desse modo, estamos a renovar uma Arquidiocese inteira.

                Com a evolução social, os campos de acção pastoral são cada vez mais e diferentes. Contudo, peço-vos para não descurarmos um campo que é a célula da vida humana: a família.

                O n.º 2207 do Catecismo da Igreja Católica diz-nos que a “a família é a comunidade em que, desde a infância, se podem aprender os valores morais, começar a honrar a Deus e a fazer o uso da liberdade. A vida da família é assim uma iniciação à vida em socidade.”

                Porque não queremos ser uma Arquidiocese de Tradições, apostar numa pastoral familiar consistente, gerará homens (e cristãos) com valores inabaláveis, ao estilo de Jesus, que produzirão um novo sistema social. E o melhor presente que os pais podem oferecer aos seus filhos, à semelhança dos reis magos, é esta educação de qualidade que Maria nos delega.

                E por outro lado, nunca o esqueçamos: Maria acompanhou Jesus com palavras e exemplo, para que o projecto do Pai se concretizasse. Daí que, caríssimos diocesanos, a educação de qualidade torna-se sinónimo de não ter medo de, na oração e conversas familiares, propor o caminho duma vocação para que a felicidade dos vossos filhos e filhas passe, porventura, por responder também um “sim” ao chamamento vocacional de Deus para uma vida religiosa ou sacerdotal. Haverá algum presente mais belo do que, à semelhança de Maria, entregar um filho para uma vida de entrega total a Deus? Deus nada tira, Ele dá tudo!

 

Um agradecimento

Para terminar, nas minhas bodas de prata episcopais, sinto-me um arcebispo orgulhoso por ver nesta arquidiocese tanta gente inconformada com uma sociedade longe do projecto do Reino de Deus.

Por isso, gostaria de agradecer, em jeito de profissão de fé, a todos aqueles que me têm ajudado na condução desta Arquidiocese de Braga:

1 – Creio em ti, caro presbítero, que és rosto transparente do amor de Deus pelo Seu povo. Comove-me ver-te partir o pão da amizade e a desatar os nós do sofrimento. Espero ter-te sempre próximo, para anunciarmos Cristo a todos que O procuram de coração sincero.

2 – Creio em ti, caro/a religioso/a, que és sinal profético do Reino de Deus. Admiro-te pela delicadeza dos teus gestos, que são uma verdadeira oração quotidiana. Espero que continues a suscitar o espanto da fé em cada irmão que se cruza no teu caminho e na comunidade onde vives.

3 - Creio em ti, caro/a jovem, que és a esperança do amanhã. Orgulha-me a tua procura inquieta, que antecipa o nascimento de um mundo melhor. Espero que me emprestes a tua voz sempre que a minha falhar. Gostaria ainda, um dia, de celebrar um encontro contigo para te apresentar Aquele que me inspirou neste nosso projeto comum.

4 – Creio em ti, caro/a irmão/ã, que vives uma situação de fragilidade. Inclino-me perante o teu espírito de heroica e silenciosa coragem. Dificilmente estamos preparados para momentos inesperados, mas a cruz, que também Cristo carregou, não tem a última palavra sobre a vida. Espero que sintas esta minha frágil e silenciosa presença por meio da oração, na certeza duma comunhão permanente com as tuas debilidades.

5 – Creio em ti, caro/a irmão/ã que habitas involuntariamente o silêncio da fé. Também para mim é um mistério este paradoxo. Sei todavia que o silêncio não é sinónimo de ausência. A fé é dom e fidelidade. Espero, peço-te, a fidelidade à procura sincera e, porventura, a decisão consciente de mergulhar no mistério de Deus, mesmo quanto tudo aquilo que ouves é silencio.

6 – Creio em ti, família expressão do visível amor de Cristo na procura conjunta da felicidade e aberta ao dom da vida. Sei que te alimentas e encorajas da Palavra de Deus. Espero ver-te verdadeira “Igreja doméstica” e comprometida na Igreja de Jesus para construirmos um mundo mais humano e unido.

7 – Olá meu/minha pequenito/a. Creio em ti pois, juntos, temos um amigo. Jesus ofereceu a todos os meninos/as do seu tempo muita dedicação, não deixando de apontar o caminho da verdadeira alegria e felicidade. Espero que O queiras conhecer para o seguir. Vamos fazer a grande família de Jesus sendo amigo d’Ele e de todos.

Sabes, um poeta muito famoso disse uma vez que “o sonho comanda a vida”. Nos sonhos, tudo aquilo que o teu coração deseja torna-se realidade. Mas também podes sonhar com os olhos abertos. Basta que tenhas um coração cheio de amor e a magia acontece. Ajuda os teus pais a sonhar. Jesus já sonha contigo. O coração Dele é enorme e ama-te.

8 – Creio em ti, caro/a cristão/ã, que, como eu, és discípulo/a peregrino/a de Cristo. Amo-te profundamente e agradeço a tua presença fiel, que tanto alegra a nossa grande família cristã. Espero que partilhes esta boa nova a todos que te são próximos e em todos os ambientes onde estás presente.

 

O célebre Pe. António Vieira dizia que “a melhor maneira de pedir é agradecer”. Por isso, como forma de agradecer a todos os membros dos Conselhos Económicos e demais famílias, deixo-vos o símbolo do meu episcopado, a romã. Trata-se de um fruto especial e é único dada às inúmeras sementes que contém em si. Assim sendo, peço-vos que neste Ano da Fé a coloqueis nos mais diversos ambientes da vossa vida, para que ela produza os frutos pastorais desejados pelo Concílio Vaticano II e pelo Sínodo Arquidiocesano de 1997, nomeadamente: nas vidas individuais para dar-mos importância idêntica ao material e ao espiritual; nas paróquias, para integrar todos os dinamismos pastorais na lógica duma única comunidade; na vida social, económica e política, para reconhecer uma dignidade igual, uma solidariedade efectiva; e nas famílias, para que se desenvolvam como espaço que acolhe a diversidade para mostrar a unidade.

Por fim, a unidade é assim o melhor testemunho que podemos dar de Deus nesta sociedade secularizada, evitando assim que Ele caia no esquecimento, ousemos vivê-la para que o mundo acredite n’Ele.

 

+ Jorge Ortiga, A. P.

6 de Janeiro de 2013, Cripta do Santuário do Sameiro.

 


[1] cf. Lumen Gentium, 57.

[2] Cf. Bento XVI, Porta Fidei, 5.

[3] Cf. Programa Pastoral da Arquidiocese de Braga – 2012/13, 7.