Arquidiocese de Braga -

17 fevereiro 2013

IGREJA NOVA: MILAGRE DE FÉ

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Fotografia

Homilia na inauguração da nova igreja paroquial de Fraião, Braga.

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Igreja Nova: milagre de Fé

Inauguração da igreja paroquial de Fraião - Braga

Numa semana em que recebemos a notícia da resignação do Santo Padre, por quem também queremos rezar nesta eucaristia, tal como ele nos pediu, um dos seus escritores preferidos, Franz Kafka, escreve: “O tempo é o teu capital; tens de o saber utilizar. Perder tempo é estragar a vida.”

Iniciamos o tempo da Quaresma: um tempo precioso que pode transformar e salvar a nossa vida. Na verdade, não pretendemos que a Quaresma seja apenas: mais um tempo do calendário litúrgico, mais um tempo de massacre penitencial ou mais um tempo inútil, mas que seja, acima de tudo, um tempo e um teste de conversão.

Aliás, como escutávamos no evangelho de hoje, o próprio Jesus não se livrou deste teste, tendo sido tentado, não só naqueles simbólicos quarenta dias,  mas durante toda a sua vida, num conjunto de três tipos de tentações que podemos considerar: a tentação do materialismo (ao idolatrar os bens materiais); a tentação do absolutismo (ao defender o fundamentalismo religioso); e a tentação do modernismo (ao divinizar as capacidades humanas).

Deste modo, eu lamento dizer-vos, mas nós também somos chamados a viver a nossa fé no meio da fragilidade, da fraqueza, da tempestade e da tentação, como nos recorda Paulo na segunda leitura.

Neste sentido, ao inaugurar a sua nova Igreja, a comunidade de Fraião (e como ela tantas outras) pode cair na tentação de pensar que tudo terminou. Só que a verdade é que estes espaços nunca podem ser considerados como um fim. Servem como um meio de que todos devem servir-se para redescobrir a identidade cristã, expressa na vivência da fé.

Este edifício conjuga duas realidades: o templo e os espaços destinados à formação e aos momentos de encontro para criar comunidade. O templo deve significar, para além da sua beleza arquitectónica, um desafio para que a comunidade só adore e preste culto a Deus numa atitude de fé, como confiança e abandono ao Seu amor. Se este amor é acolhido, como comunidade de crentes, reconhecemos a necessidade do encontro comunitário, ao domingo, como indispensável e não reduzido a diversas circunstâncias sociais.

Aceitaremos a força dum povo sacerdotal, numa compreensão da Igreja do Concílio Vaticano II e não de meros hábitos e rotinas, onde cada um aceita a sua responsabilidade para que na harmonia dos talentos e a generosidade de os colocarmos ao serviço da comunidade, a beleza da liturgia resplandeça mostrando o rosto resplandecente da Igreja e de Cristo. É este testemunho da beleza, não meramente arquitectónica mas verdadeiramente eclesial, que fará reconhecer que este espaço é de todos e para todos e que, por isso, na comunidade paroquial, há muitos que não participam no banquete da Ceia de Cristo. A inquietação por aqueles que estão fora é responsabilidade de todos e intuir as causas da ausência ou do abandono é uma consequência natural de quem vive a fé.

Ao discernir estas causas importa encontrar caminhos que manifestem os verdadeiros conteúdos da fé e como estes nunca são obstáculo à autêntica felicidade mas são verdadeiros valores com capacidades de tornar a vida humana experiência significativa e construtiva. Se este espaço litúrgico é belo, ele só se compreende como parte dum outro edifício onde a catequese e formação se torna nova evangelização em modos novos de comunicar o Evangelho, com audácia e coragem, e experiência de convívio para retemperar energias e dar coragem para a tarefa difícil do viver. Aqui se realizam encontros, sempre na atitude de partir para a vida com coragem e com um programa de identificação com Cristo através dum estilo de vida que nem sempre coincide com os critérios do mundo, mas dá felicidade!

Só a articulação entre estes dois espaços e aquilo que eles significam, não como acabados mas como propostas de novas iniciativas, é que esta nova Igreja permitirá que todos os cristãos que compõem a comunidade se possam orgulhar dela. Não esqueçamos que a inauguração acontece em Ano da Fé como convite a redescobrirmos a nossa identidade cristã que passa pela fé como confiança em Cristo que provoca a necessidade de compreender os conteúdos do Credo, crescendo como comunidade de crentes a tornar-se “Luz dos povos”. Não esqueçamos que o Ano da Fé acontece para celebrarmos os 50 anos do Concílio Vaticano II e que, por isso, quisemos estudar a Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja, e aí se diz que a luz de Cristo deve resplandecer no rosto da Igreja para iluminar ardentemente todos os homens. Acabadas as obras materiais, que conferem mais conforto e dignidade às celebrações litúrgicas, surge a responsabilidade de continuar agora as obras pastorais.

Para que a comunidade não se deixe contaminar pela tentação dum trabalho concluído, peço que veja nesta igreja um instrumento em cujo rosto resplandece só a luz de Cristo e ilumina todos os homens, desta comunidade e desta cidade.

Se não podemos ficar somente extasiados pelo trabalho realizado, a liturgia leva-nos a ouvir quanto o Senhor nos diz no Livro do Deuteronómio: “O Senhor receberá da tua mão (Moisés), as primícias dos frutos da terra e colocá-las-á diante do altar do Senhor teu Deus”. Hoje eu, como durante todo o tempo da construção, e o vosso pároco, recebo os frutos das vossas primícias e coloco-as diante de Deus. Recebo tudo quanto cada um aqui colocou. Muitos se admiram das obras que a Igreja realiza. Há aqui muita generosidade para com Deus reconhecendo que tudo quanto temos nos foi dado. Há pedaços de vida, uns maiores outros menores, que tornam este espaço verdadeiramente diferente de muitos outros espaços públicos.

Aqui está a fé e é por isso que muitos não compreendem as maravilhas que ela realiza. Eu, simples ministro do Senhor, apenas recebo para colocar o que destes a Deus no Seu coração para que Ele vos reconforte e dê coragem para a vossa caminhada diária. Conheço pessoalmente muitos rostos desta generosidade, vivos e falecidos. Outros são, para mim, anónimos. A todos, e pensando em alguém por quem nutria uma simpatia especial, muito obrigado pelo testemunho neste tempo em que não apetece dar, há pouco para dar e se encontram desculpas variadas para não dar.

Para terminar, que S. Tiago, vosso Padroeiro, vos conceda o dom da alegria de estar com Cristo, de viver com Cristo, como ele o fez, de tal modo que esta igreja seja, só e apenas, um testemunho inequívoco do vosso Amor a Ele e vontade de dardes à vossa vida e à vossa comunidade a apostolicidade que marcou a vida do vosso Padroeiro.

E não se esqueçam: se o tempo é o nosso maior capital, então não desperdicemos esta oportunidade quaresmal para a conversão!

+ Jorge Ortiga, A. P.

Igreja Paroquial de Fraião (Braga), 17 de Fevereiro de 2013.