Arquidiocese de Braga -
15 março 2004
Homenagem a Aguiar Barreiros
Dom Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz
\nViver o presente é a grande opção preferencial dos tempos actuais. Com muita naturalidade, caminhamos para uma perda do sentido da continuidade história pretendendo viver para si, esquecendo-se dos antepassados e negligenciando os vindouros. Parece que o sentido de pertença a uma comunidade com raízes no passado e horizontes de futuro se desvanece. O sentido do tempo histórico projecta-se na ilusão momentânea do bem estar pessoal, da tranquilidade psíquica, da saúde física. É uma caracterização do mundo juvenil que não deixa de influenciar os adultos.
É neste contexto, onde o modelo consumista nos torna vizinhos de tudo e de todos mas fechados numa atenção narcisista dum hoje sem alicerces e respeito por quanto lhe deu origem, que teremos de reagir num reavivar a memória para aprender e testemunhar gratidão. Somos o que somos devido à tenácia de homens que souberam recolher para legar, dando, deste modo, profundidade e consistência ao presente.
O Cón. Manuel Aguiar Barreiros situa-se na história do presbitério bracarense como estímulo e provocação. Amante duma causa, consegue iniciar um projecto que muitos admiram e louvam. A recolha efectuada torna possível a leitura da nossa história em linguagem que todos compreendem. Sem o seu trabalho, a difusão de memória teria chegado às mãos de oportunistas que as saborariam duma maneira pessoal ou comercializada.
Precisamos, mais do que nunca, destas referências e este tesouro – com o trabalho de outros os que lhe deram continuidade e por aquilo que ele significa para a Arquidiocese e para a cidade – tem de confirmar o esforço que estamos a desenvolver de preservar o nosso passado para que entre a fazer parte do presente de muitas gerações. Ainda há muita incúria e inércia. O pouco de todos os sacerdotes mostrará o verdadeiro rosto da Igreja que somos.
Quero aproveitar o ensejo desta homenagem para me congratular com quantos aprenderam com o exemplo do Cón. Barreiros e, à sua medida, prestam atenção ao património artístico e cultural. Evoco, também, o seu exemplo para que ninguém se situa à margem desta orientação pastoral de inventariar e conservar o legado das nossas comunidades. Sem esta intenção e cuidado persistente o nosso presente está viciado pelos erros do utilitarismo e imediatismo. Não se trata duma questão de poucos. Ou todos os sacerdotes se envolvem ou resignamo-nos a um trabalho incompleto.
Costumo referir que as homenagens são incompletas se não provocam imitadores. O Cón. Barreiros merece que o clero de Braga se apaixone mais pelo Património reconhecendo-o como um verdadeiro elemento evangelizador. Mostrando o passado acorda para a responsabilidade de merecer um presente com obras que testemunham a adesão a Cristo.
Hoje, estamos a pronunciar um obrigado pelo homem e pela obra. Como esta se consignou, dum modo eloquente, na Fundação do Tesouro-Museu da Sé estamos a ser dignos do seu exemplo através das obras em curso que irão permitir um enquadramento mais sistemático e em consonância com as novas exigências museológicas. Dispomos dum autêntico Tesouro; temos o dever de o dignificar. Com a criação de novos espaços e condições estamos a ser Igreja e sociedade que não só respeitam o trabalho dos antepassados mas potencializam-no. Esta homenagem é – ou deve ser – pretexto para reforçar a fé num Tesouro-Museu da Catedral como referência bracarense e nacional a que os inúmeros estrangeiros que o procuram saberão enquadrar num contexto do bom que existe a nível mundial. A fé nesta jóia da cultura bracarense torna-se esperança alegre que envolve todas as sinergias para que o projecto avance com a serenidade das grandes obras mas também com a rapidez daquilo que distinguirá este nosso tempo.
Braga necessita dum Museu-Tesouro da catedral com as características e condições da Museologia hodierna. Seremos dignos do presente e homenagearemos quem nos antecedeu. O Cón. Manuel Aguiar Barreiros será sempre evocado e nós não fugiremos à nossa responsabilidade.
Sé Catedral, 27.02.2004
Partilhar