Arquidiocese de Braga -

3 maio 2021

Frei Abel de Jesús: “Quem se escandaliza, não evangeliza”

Fotografia Jesús G. Feria

DACS com Vida Nueva Digital

O Carmelita Descalço de Tenerife, com 28 anos, foi o vencedor do "III Prémio de Ensaio Teológico Jovem PPC" devido ao seu trabalho “Internet e vida contemplativa. Como fazer com que a tua espiritualidade sobreviva na Era Digital”. A obra já está à venda.

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Frei Abel de Jesús define-se como o “apóstolo das esferográficas abandonadas”. No “Teonáutica”, o seu canal no Youtube, procura aproximar a religião jovens com criatividade, bom humor e abrindo espaço para a oração pela “comunhão online de todos os santos”.

“O que marca mais profundamente a minha vida é um amor desajeitado, resignado e inabalável por Jesus, que me levou aos lugares mais inesperados”, assegura sobre a aventura digital a que a vocação de consagrado o conduziu.

Como é ser considerado o melhor jovem teólogo do ano?
Quando entramos num concurso como este, fazemo-lo sempre com a esperança de que a nossa investigação seja valorizada, mas daí até ser o melhor teólogo vai um abismo. Apresentei o trabalho no último dia de convocatória porque não sabia se encaixava, tem muito de sociologia e psicologia, uma fórmula híbrida.


O subtítulo do seu trabalho é “Como fazer com que a tua espiritualidade sobreviva na Era Digital”. Existe futuro para a Igreja fora das redes sociais?
Uma das teses do livro é que a internet é um dos continentes mais habitados do mundo. É realidade, não mera virtualidade. Por isso, a Igreja não pode não estar, da mesma forma que não pode não estar na Ásia a evangelizar. Se somos missionários, temos que estar no continente digital.


Mas não podemos estar de qualquer forma no Tik Tok, Instagram...
Esse é o grande assunto pendente: a formação. Da mesma forma que não te instalas apenas num país de missão, tens antes que te inculturar, não podes deixar-te cair nas redes. No canal do Youtube insisto muito nessa ideia: de boas intenções está o Inferno cheio. Por vezes, apenas com boa vontade, causamos grandes danos.


Dê-me um conselho básico para usar da mesma forma o Twitter e o Facebook.
Quem se escandaliza, não evangeliza. Se à mínima coisa entras nas redes e levas as mão à cabeça pelo tom de alguns comentários, pelos assuntos que são abordados ou pela forma como os jovens vêem a realidade, tens tudo a perder. Desde o antigo Egipto que temos consciência que os jovens de hoje não são como os de antigamente, mas deixar-nos levar por esse olhar envelhecido sobre a realidade não leva a lugar nenhum. Os jovens são sempre jovens e causam dores de cabeça, e o mundo esteve sempre mais ou menos mal.


As redes não se tornaram num pátio de escola onde só há lugar para insultos?
Diante desta realidade, outra das minhas máximas: quem polariza, não evangeliza. Se nas redes promovemos a divisão eclesial e as lutas internas – algo que infelizmente acontece com frequência –, estamos mal.


A aposta na comunicação ainda é vista, nas dioceses e nas congregações, mais como despesa adicional do que como investimento?
Temos que gastar e gastar-nos na comunicação. Se dizemos que a razão da Igreja é evangelizar, mas não gastamos naquilo que nos permite cumprir a missão, não somos fiéis ao que nos é confiado. É preciso gastar dinheiro, tempo e pessoas. Por exemplo, temos um défice terrível em produções audiovisuais de qualidade, tanto na forma, como no conteúdo. É normal que as pessoas não queiram consumir filmes católicos, porque não se faz um um investimento real. Não basta ter os próprios canais de rádio e televisão da Igreja para cristãos convictos. Já a instrução pastoral Communio et progressio (1971) apontava que as pessoas não estavam em condições de sustentar conteúdos de qualidade igual ou inferior aos que estão habituadas a consumir. Diante da listagem da Netflix, não podemos apresentar-nos com uma coisa medíocre. Será mais contraproducente do que benéfico.

 

Entrevista de José Beltrán, publicada em Vida Nueva Digital, a 02 de Maio de 2021.