Arquidiocese de Braga -

10 novembro 2021

Papa Francisco: "A esmola é ocasional, a partilha é duradoura"

Fotografia CNS / L'Osservatore Romano

DACS

Mensagem para o V Dia Mundial dos Pobres, celebrado a 14 de Novembro de 2021, tem como tema “«Sempre tereis pobres entre vós» (Mc 14, 7)”

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Foi hoje de manhã apresentada a Mensagem do Papa Francisco para o V Dia Mundial dos Pobres, que será celebrado a 14 de Novembro de 2021.

Com o título “«Sempre tereis pobres entre vós» (Mc 14, 7)”, a mensagem relembra a passagem bíblica em que uma mulher derrama sobre a cabeça de Jesus um perfume “muito precioso”. Perante a indignação de alguns dos presentes, Jesus pede que se deixe a mulher em paz, já que terá praticado “uma boa acção”.

“Jesus sabe que está próxima a sua morte e vê, naquele gesto, a antecipação da unção do seu corpo sem vida antes de ser colocado no sepulcro. Esta visão ultrapassa todas as expetativas dos convivas. Jesus recorda-lhes que Ele é o primeiro pobre, o mais pobre entre os pobres, porque os representa a todos. E é também em nome dos pobres, das pessoas abandonadas, marginalizadas e discriminadas que o Filho de Deus aceita o gesto daquela mulher. Esta, com a sua sensibilidade feminina, demonstra ser a única que compreendeu o estado de espírito do Senhor”, escreve Francisco.

A partir desta lembrança, o Pontífice recorda “todo o universo feminino que, no decurso dos séculos, não terá voz e sofrerá violências” e elogia as mulheres “tantas vezes discriminadas e mantidas ao largo dos postos de responsabilidade” que, nas páginas do Evangelho são, pelo contrário, “protagonistas na história da revelação”.

“Esta forte «empatia» entre Jesus e a mulher e o modo como Ele interpreta a sua unção, em contraste com a visão escandalizada de Judas e doutros, inauguram um fecundo caminho de reflexão sobre o laço indivisível que existe entre Jesus, os pobres e o anúncio do Evangelho. Com efeito, o rosto de Deus que Ele revela é o de um Pai para os pobres e próximo dos pobres. Toda a obra de Jesus afirma que a pobreza não é fruto duma fatalidade, mas sinal concreto da sua presença no nosso meio”, explica Francisco.

O Papa sublinha que os pobres são “verdadeiros evangelizadores” por permitirem “descobrir de modo sempre novo os traços mais genuínos do rosto do Pai”.

“Eles «têm muito para nos ensinar. Além de participar do sensus fidei, nas suas próprias dores conhecem Cristo sofredor. É necessário que todos nos deixemos evangelizar por eles. A nova evangelização é um convite a reconhecer a força salvífica das suas vidas, e a colocá-los no centro do caminho da Igreja. Somos chamados a descobrir Cristo neles: não só a emprestar-lhes a nossa voz nas suas causas, mas também a ser seus amigos, a escutá-los, a compreendê-los e a acolher a misteriosa sabedoria que Deus nos quer comunicar através deles»”, afirma, recordando a exortação Evangelii Gaudium.

O Pontífice explica que Jesus não está apenas do lado dos pobres, partilhando também com eles a mesma sorte e pede aos fiéis que façam o mesmo, não encarando as pessoas marginalizadas como externas à comunidade.

“A esmola é ocasional, ao passo que a partilha é duradoura. A primeira corre o risco de gratificar quem a dá e humilhar quem a recebe, enquanto a segunda reforça a solidariedade e cria as premissas necessárias para se alcançar a justiça. Enfim os crentes, quando querem ver Jesus em pessoa e tocá-Lo com a mão, sabem aonde dirigir-se: os pobres são sacramento de Cristo, representam a sua pessoa e apontam para Ele”, sublinha.

A mensagem aponta ainda a necessidade de conversão, abrindo o coração para que possam ser reconhecidas as múltiplas expressões de pobreza e manifestando o Reino de Deus através de um estilo de vida coerente com a fé professada.

“Com frequência, os pobres são considerados como pessoas à parte, como uma categoria que requer um serviço caritativo especial. Seguir Jesus comporta uma mudança de mentalidade a esse propósito, ou seja, acolher o desafio da partilha e da comparticipação”, alerta o Papa.

Jorge Mario Bergoglio pede especial atenção às novas formas de pobreza agravadas pela pandemia e relembra que os pobres não são responsáveis pela sua condição nem devem ser considerados como um “um peso intolerável para um sistema económico que coloca no centro o interesse de algumas categorias privilegiadas”.

“Um mercado que ignora ou discrimina os princípios éticos cria condições desumanas que se abatem sobre pessoas que já vivem em condições precárias. Deste modo assiste-se à criação incessante de armadilhas novas da miséria e da exclusão, produzidas por agentes económicos e financeiros sem escrúpulos, desprovidos de sentido humanitário e responsabilidade social”, afirma.

O Santo Padre diz que “é urgente dar respostas concretas” ao drama do desemprego e que a “solidariedade social e a generosidade” de muitas pessoas são capazes de dar um “contributo muito importante nesta conjuntura”.

“Entretanto permanece de pé uma questão, nada óbvia: Como se pode dar uma resposta palpável aos milhões de pobres que tantas vezes, como resposta, só encontram a indiferença, quando não a aversão? Qual caminho de justiça é necessário percorrer para que as desigualdades sociais possam ser superadas e seja restituída a dignidade humana tão frequentemente espezinhada?”, questiona, explicando que a pobreza não é fruto do destino, mas antes do egoísmo.

O Papa afirma que é necessária “uma abordagem diferente da pobreza” e apela aos governos e instituições de todo o mundo que se unam através de um “modelo social clarividente capaz de enfrentar as novas formas de pobreza que invadem o mundo e marcarão de maneira decisiva as próximas décadas”.

“Com grande humildade, temos de confessar que muitas vezes não passamos de incompetentes a respeito dos pobres: fala-se deles em abstrato, fica-se pelas estatísticas e pensa-se sensibilizar com qualquer documentário. Ao contrário, a pobreza deveria incitar a uma projetação criativa, que permita fazer aumentar a liberdade efetiva de conseguir realizar a existência com as capacidades próprias de cada pessoa. Pensar que a posse de dinheiro consinta e aumente a liberdade é uma ilusão de que devemos afastar-nos”, afirma.

Francisco conclui a Mensagem dizendo que “aumentar a sensibilidade para se compreender as exigências dos pobres” é decisivo.

“Com efeito, nas áreas economicamente mais desenvolvidas do mundo, está-se menos predisposto hoje que no passado a confrontar-se com a pobreza. O estado de relativo bem-estar ao qual se habituaram torna mais difícil aceitar sacrifícios e privações. Está-se pronto a tudo só para não ficar privado daquilo que foi fruto de fácil conquista. Deste modo, cai-se em formas de rancor, nervosismo espasmódico, reivindicações que levam ao medo, à angústia e, nalguns casos, à violência. Este não é o critério sobre o qual construir o futuro; também estas são formas de pobreza, para as quais não se pode deixar de olhar”, conclui.

Pode ler a Mensagem do Papa Francisco para o V Dia Mundial dos Pobres aqui.