Arquidiocese de Braga -

4 julho 2022

Efeitos imediatos e futuros: esta guerra está cada vez mais a devastar África

Fotografia DR

DACS com Avvenire

"Diferentes nomes, diferentes faces de uma crise que irá levar o mundo da inflação descontrolada à nova recessão. E esses sinais, há dias, têm sido captados bem no coração ferido de África."

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Cuidado, porque os sinais estão todos presentes. E são claros como quando a ONU e a OMS, juntamente com muitas organizações não governamentais, lançavam os alarmes no Ocidente que conseguia garantir para si a protecção vacinal contra a Covid e a África, em vez disso, tinha que se contentar com doações pontuais de países ricos ou reivindicava o direito de infringir patentes e produzir as suas próprias doses.

Hoje, a “nova Covid”, menos abrangente, mas igualmente devastadora e sobretudo induzida, chama-se “trigo”, ou “energia”.

Diferentes nomes, diferentes faces de uma crise que irá levar o mundo da inflação descontrolada à nova recessão. E esses sinais, há dias, têm sido captados bem no coração ferido de África.

No Gana, pessoas famintas foram às ruas de Acra para entrar em confronto com a polícia. Que não poupou nos cassetetes e no uso de gás lacrimogéneo.

No Malawi, como noutros países com economias debilitadas, o preço do combustível aumentou geometricamente.

Em poucas semanas, a gasolina em Lilongwe subiu para o equivalente a dois euros e meio. Não há carros, excepto os dos militares, dos ricos, ou dos políticos: a distinção entre os quais, naquelas latitudes, é sempre difícil de fazer. Na rica (de petróleo) Nigéria acontece o mesmo.

A pobreza galopa por toda parte, como a fome. No Corno de África, as Nações Unidas reduziram primeiro as rações de ajuda alimentar e, em alguns casos, tiveram que suspendê-las. A equação é elementar: para a mesma quantidade de dinheiro disponível, a soma que antes permitia comprar quatro quilos de farinha, hoje permite conseguir menos de metade. Com a reacção em cadeia e o efeito dominó resultante.

As próprias “economias do controlo do pão”, por exemplo a do Egipto e de outros países nas margens do Nilo, estão a manter sob controlo os ânimos, mas com dificuldade.

Antes desta crise, desencadeada pelo conflito ucraniano e pelo encerramento dos portos (também) do trigo, em Cartum – nas margens do Nilo – já se morria nas ruas por pão e para pedir o regresso de um ditador que tinha governado com os pães, com fingida devoção aos princípios do Alcorão e aos milicianos. Chama-se Omar el-Bashir: está a ser processado por crimes cometidos contra a humanidade. Ou, pelo menos, deveria sê-lo.

Mas, voltando aos dias de hoje, em que os sinais já foram destacados até nestas páginas por vários observadores que falam abertamente sobre a nova bomba da fome africana, o problema realmente corre o risco de se tornar devastador. Também porque a velocidade da circulação dos alimentos e os tempos de resposta humanitária em África são terrivelmente dilatados em comparação com os do Ocidente.

Alguns analistas acreditam que a curva dos efeitos sobre os preços dos eventos actuais – escassez de fornecimento de cereais, aumento de hidrocarbonetos – na Europa Ocidental poderia começar a diminuir já no fim do Verão. Veremos.

Em África, por outro lado, a explosão foi e tende a ser impressionante, com um efeito multiplicador que durante anos irá devastar as estatísticas de desenvolvimento, fome e pobreza. Ou seja, irá contribuir para aumentar o “fosso” que a pandemia tornou mais evidente, trazendo de volta as tabelas estatísticas aos terríveis valores da primeira década do novo século.

Em 2020, 12% (de 8,4% em 2019) da população mundial viveu num estado de grave insegurança alimentar, cerca de 928 milhões de pessoas, 148 milhões a mais que em 2019. Depois veio a pandemia e agora a guerra e a crise dos produtos.

Acabou de terminar um G7 nos castelos da Alta Baviera, o G20 terá que esperar por Novembro e o único factor desconhecido parece ser a presença ou ausência de Vladimir Putin na Indonésia.

A ausência de uma intervenção verdadeiramente urgente, para ajudar quem ajuda a ajudar, infelizmente, é uma dramática certeza.

 

Artigo de Fabio Carminati, publicado em Avvenire a 1 de Julho de 2022.