Arquidiocese de Braga -
8 julho 2024
Opinião
O Mosteiro de Tibães
No próximo dia 11 de julho, os cristãos celebram uma das suas mais destacadas personalidades: Bento de Núrsia. Fundador dos beneditinos, a mais importante ordem monástica da história da Igreja Católica, São Bento instituiu uma forma de vida inovadora, que se propagaria por toda a Europa, influenciando decisivamente o ritmo dos territórios onde se implantavam.
À sombra dos mosteiros beneditinos floresceria a difusão de práticas culturais, bem como o desenvolvimento agrícola, sendo ainda responsáveis pelo surgimento das cidades e vilas do seu entorno. Por isso mesmo, São Bento seria declarado padroeiro da Europa em 1964, pelo Papa Paulo VI.
Um dos mais importantes mosteiros beneditinos implantados no território português localiza-se em Braga, mais propriamente na freguesia de Mire de Tibães. Apesar de ser aventada uma presumível fundação no decorrer do século VI por intermédio de S. Martinho de Dume - dado estar devotado a São Martinho de Tours, um culto trazido para o Noroeste peninsular por aquele prelado – a origem do cenóbio tibanense deverá recuar ao final do século XI, momento em que foi fundado por Paio Guterres da Silva, maiorino de Afonso VI, rei de Leão e Castela, sendo depois confiado à Ordem de São Bento. No ano de 1110 ser-lhe-ia outorgada Carta de Couto pelo Conde D. Henrique e pela Condessa D.ª Teresa.
Reunindo todas as condições predispostas na regra beneditina, o território onde se implantou o Mosteiro de Tibães beneficiava de um significativo isolamento, detendo um vasto e fértil terreno, com abundância de águas e rodeado de zonas florestais. Implantado no sopé do monte de São Gens, muito próximo do ancestral povoado castrejo do monte das Caldas, a escassas centenas de metros do rio Cávado, o couto do Mosteiro de Tibães, além do território da atual freguesia de Mire de Tibães, incluía também as freguesias de Padim da Graça, Parada de Tibães, Panóias, mas também parcelas de Merelim São Paio, Merelim São Pedro ou Frossos.
O primitivo mosteiro românico era de modestas dimensões, indiciando uma prévia construção com caraterísticas pré-românicas (Fonte, 2005), nada restando na sua atual configuração. O ano de 1567 vai revestir-se de uma importância fulcral na sua história, momento em que, no âmbito da reforma pós-tridentina da Ordem de São Bento, se assistiu à criação da Congregação Beneditina dos Reinos de Portugal e do Brasil, ficando o Mosteiro de Tibães como Casa-Mãe de todos os seus mosteiros. Nesta sequência, o edifício sofrerá obras de reformulação e ampliação, que alteraram significativamente a sua fisionomia no decorrer do século XVII.
O templo afirma-se como o espaço mais deslumbrante e imponente do Mosteiro, o lugar da “mística tibanense”, tal como a definiu o historiador de arte norte-americano, Robert Smith, impressionado pela força do conjunto artístico ali implantado. O seu espaço mais extraordinário é a capela-mor, reformulada sob projeto de André Soares entre 1755 e 1760 (Oliveira, 2011), no entanto, todo o conteúdo decorativo do seu interior permite-nos um percurso pela história da arte barroca em Portugal, desde o maneirismo (ou proto-barroco), passando pelo período nacional e joanino, com paragem obrigatória no rococó da capela-mor e dos retábulos do transepto, e culminando no neoclássico dos seus retábulos mais recentes. Destaque-se ainda a sacristia, com um conjunto de esculturas da autoria de Frei Cipriano da Cruz, mas também o Coro Alto, onde se pode admira um impressionante cadeiral maneirista.
Na área monacal, destaque-se a Sala do Capítulo, o jardim de São João ou o pátio de Jericó, além do seu claustro principal, de feição maneirista. Além dos seus edifícios, o Mosteiro de Tibães detém uma ampla cerca, constituída por matas, campos agrícolas e pomares, na qual, além de um grande lago, se encontram algumas fontes e uma elegante escadaria barroca pontilhada de fontes, que culmina na Capela de São Bento.
A história do Mosteiro de Tibães, tal como a dos demais edifícios conventuais existentes em Portugal, alterou-se drasticamente em 1834, com o decreto de extinção das ordens religiosas. Abandonado pelos beneditinos, o mosteiro seria vendido em hasta pública, passando para a posse de privados, à exceção da “igreja, sacristia, claustro do cemitério, hospedaria, coristado e o passal” que seriam confiados à paróquia de Mire de Tibães.
Passando a ser utilizado para finalidades divergentes daquelas para que tinha sido construído, o edifício monacal entraria numa fase de progressiva degradação, exposto à incúria e à pilhagem dos seus bens, situação agravada por um pavoroso incêndio no ano de 1894, que destruiria uma parte significativa do seu setor nordeste.
Encontrando-se num estado de quase total ruína, com a exceção das áreas confiadas à paróquia, a sociedade civil bracarense, encabeçada pela ASPA, alertaria para a urgência da sua salvaguarda, tendo sido adquirido pelo Estado no ano de 1986. Instituído como museu em 1990, entraria num processo de reabilitação, que perduraria ao longo de quase três décadas, confirmando-se atualmente como um dos monumentos mais relevantes do panorama artístico português.
Frei José Vilaça
Entre os incontáveis membros da ordem beneditina que passaram pelo Mosteiro de Tibães, destaca-se inequivocamente o nome de Frei José de Santo António Vilaça. Escultor, entalhador e arquiteto, este monge beneditino era natural da cidade de Braga, tendo nascido a 18 de dezembro de 1731, numa casa bem próxima da Capela de São Lázaro. Após ingressar na ordem beneditina, haveria de acompanhar André Soares na obra da capela-mor do Mosteiro de Tibães, deixando-se inspirar pela arte do génio do rococó, que haveria de influenciar decisivamente o seu percurso artístico. Desenhando retábulos, púlpitos, sanefas, portas e janelas, caixas de órgãos e cadeiras, bancos ou credências, além de Tibães, Frei José Vilaça seria chamado a colaborar nas obras de reformulação dos mosteiros beneditinos do Norte de Portugal, nomeadamente de Refojos de Basto, Pombeiro ou Santo Tirso. Também deixou a sua marca na cidade de Braga, onde foi autor dos desenhos da capela-mor da igreja de Santa Cruz ou do retábulo do Oratório da Senhora da Torre. Viria a falecer em 1809, tendo sido sepultado no claustro principal do Mosteiro de Tibães.
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