Arquidiocese de Braga -

24 setembro 2021

Encontrei uma terra cheia de vida

Fotografia Pe. Manuel Faria

O Conquistador

Pe. Manuel António Faria, equipa missionária Salama!

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A Igreja em Cabo Delgado (Moçambique), na Diocese de Pemba, é toda missionária! Este é o chamamento do Evangelho e a resposta fiel do seu povo!

Quero deixar aqui o testemunho desta experiência única de missão, para a renovação da minha fidelidade à Igreja para a qual fui constituído sacerdote.

Vim de Guimarães para Moçambique, como sacerdote “fidei donum”, sem saber muito sobre o país. Queria fazer uma nova experiência da vida pastoral da Igreja, Igreja em saída, pobre entre os pobres, animada pela caridade, como pede o papa Francisco, e conhecer uma Igreja toda ela ministerial, onde não se acentua a distinção entre clerical e laical, mas sim o mistério eclesial, um “corpo místico de Cristo”, onde cada membro realiza a sua função para o bem de todo o corpo, como bem escreve São Paulo, patrono desta diocese de Pemba!

Chegado à missão de Santa Cecília de Ocua, vendo a alegria do nosso acolhimento pela comunidade paroquial, a felicidade nas suas caras ao ver-nos de “corpo e alma na missão de Ocua”, e o modo como apreciavam a nossa companhia e queriam que nos sentíssemos bem-vindos, logo experimentei na minha sensibilidade eclesial, que a Igreja é assim mesmo lugar de acolhimento, de partilha, de desafio a chegar junto daqueles que esperam sinais, da presença comprometida da Igreja, com todos os lugares e realidades da vida humana.

Estamos a residir numa região muito tradicional da cultura moçambicana - região de cultura Macua e Maconde, na província de Cabo Delgado, que é na verdade dos melhores lugares para conhecer o país cheio de ritos e tradições africanas!

A comida é uma agradável surpresa, desde a Xima até à maçaroca de milho, a mandioca logo para “matabichar” ou a matapa de moringa, a “nipa” ou a fruta tropical.

Mais difícil é a inculturação no comércio local. Aqui a moeda, o metical (MT), tem um valor muito diferente do euro (€), pois precisamos de 80 meticais, muitas moedas e notas, para obter apenas um euro no câmbio da moeda. Milhares de meticais, correspondem a poucos euros, o que dificulta entender o real valor da economia moçambicana. Mas, na verdade a melhor moeda de troca é a partilha da fé, das dificuldades, de histórias numa bela conversa, um sorriso sempre de “orelha a orelha” nas crianças, ou a preocupação e simpatia dos jovens e adultos para connosco. Nunca regateei por amigos, pois estão em todos os nossos caminhos de vida missionária.

Quero também destacar as construções bem originais dos edifícios da Igreja ou as casas das famílias desta região são simples, muito pobres, precários e feitos com muito capim (palha seca) que traz uma decoração bem natural às terras secas e amareladas de África. Aqui tudo é provisório, amanhã pode ser necessário partir, deixar tudo, e construir noutro local ou casa ou nova Igreja.

As estradas têm sempre enormes buracos para desafiar a nossa condução e perícia em contornar obstáculos. Só conheço uma estrada, assim bem difícil de circular, depois uma imensidão de caminhos, trilhos, picadas ou carreiros, onde todos andam a pé, carregando água da fontanária, lenha ou carvão das matas, mandioca ou milho das machambas.

Posso garantir que comecei a aperceber-me de que na verdade encontrei uma terra cheia de vida, onde os tempos antigos, as histórias e ritos ancestrais são o presente. Não sei contar mais os anos ou as horas, tal como este povo, que nasceu naquele ano de seca, depois daquelas tempestades ou naquele bom tempo de colheitas. Tem a idade que tem a natureza, tem apenas duas horas: as horas do dia que tem o sol, ou as horas da noite que tem a lua!

Artigo publicado no Jornal O Conquistador de 24 de setembro de 2021.


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