Arquidiocese de Braga -

31 agosto 2023

Ser peregrina numa missão em Cabo Verde: “Do caminho começado nunca se volta igual”

Fotografia DR

Sara Madureira

Testemunho da missão de uma jovem, na ilha do Maio, com a Pastoral Universitária de Braga

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Chegou ao fim mais uma missão em África levada a cabo pela Pastoral Universitária de Braga. Este ano foi uma missão especial, tendo em conta que o Projeto Sementes não preparou as missões habituais em África por ser o ano da Jornada Mundial da Juventude. Mesmo assim, partimos para uma pequena missão. Fomos cinco elementos, desta vez apenas colaboradores da Pastoral e o seu diretor, o Pe. Eduardo Duque, por um período de duas semanas, que se seguiu à Jornada Mundial da Juventude, com o objetivo de estar na comunidade da ilha do Maio. 

Apesar de já ter vivido uma missão em Cabo Verde, move-se ainda, tão subtilmente, o entusiasmo de uma nova partida. Sou novamente peregrina, ao me afastar das coisas do dia a dia, ao fazer-me ao caminho, ao tornar-me contemplativa. Hoje, levanto-me pelo poder do Céu. 

Para mim, é sempre difícil pensar e escrever estas experiências e passá-las para o papel. Primeiro vive-se e não se pensa em nada de forma muito profunda. Mas hoje, quando fecho os olhos, continuo a ver tudo no escuro. Estou ainda a viver, naquele lugar, com aquelas pessoas, aquele céu estrelado, aquele mar azul transparente que nos derruba o corpo e transborda a alma de alegria, aquele calor húmido. Ainda estou a digerir toda a informação recebida com este reencontro com as gentes, os sabores e as paisagens africanas. O amor sentido é grande e parece que ali se vive para além do tempo.

A casa a que regressei em Portugal é tão distante da que deixei na passada manhã do dia 23 de agosto! Tem cheiros e cores diferentes! Na viagem feita ao longo destas duas semanas sentimos sobre o corpo um cansaço que nos deixou um pouco “embriagados” pela confusão das sensações vividas, mas muito felizes pelos dias intensos e únicos que experimentamos. 

Foram duas semanas em constante viagem física e espiritual. A nossa ida para a ilha do Maio coincidiu com o tempo das chuvas, que provocam no mar imponente uma grande agitação, ventos fortes e ondas de grande dimensão. Quando assim é, não adianta enfrentar a fúria da natureza. Também isto sabe a missão, porque nos faz sentir a terra e o seu poder. 

Enquanto aguardávamos o dia da viagem na “Kriola” - nome da embarcação que nos levaria até ao Maio - estivemos em casa de uma família em Praia Baixo, na ilha de Santiago, que de forma incansável, e própria da cultura cabo-verdiana, nos fizeram sentir amados como membros da própria família. Ainda sinto o perfume daquelas refeições, cuidadosamente preparadas e o sabor da tamanha explosão de sensações experimentadas. Mas não foi só o paladar que saiu apurado de Cabo Verde, foi o encontro com o mundo, através da profusão dos sentidos. Trago no olhar o sorriso subtil das crianças, a beleza das paisagens, nos ouvidos as vozes afinadas dos jovens do coro, os sons da escala da morna, no cheiro o aroma denso da cultura que nos envolve, no coração a simplicidade e humildade de um povo que, embora pobre, doa o que tem e que, em nome de um Deus que adoramos em comum, acolhe o estrangeiro como seu irmão. Tudo isto me suscita múltiplos sentimentos, sobretudo, o da gratidão, e me faz aproximar ainda mais do Criador, pelas maravilhas da sua criação. 

Chegados à ilha do Maio percebemos logo que a realidade era um pouco diferente. Embora fosse Cabo Verde, senti que aquela ilha era especial. Maio ostenta uma beleza singular. As ruas calçadas em paralelo, as casas que pintam o território de várias cores, o mar que varia entre o azul safira e o verde esmeralda, a mistura da areia branca e preta que se envolve nas praias desertas, a calma que ali se vive, a simpatia calorosa dos seus habitantes, que não nos deixam de surpreender com a sua “morabeza”, a devoção a Deus que é intensa e verdadeira. 

Fui vivendo a missão com aquelas pessoas maravilhosas, enquanto os pés tocavam a terra numa relação viva, com sensações nunca iguais. 

Os jovens da ilha do Maio envolvem o seu coração nas coisas de forma intensa. Aprendi muito com eles ao ouvir os seus testemunhos nos diferentes encontros que fomos criando nas paróquias que visitamos. Percebi o quanto somos iguais, o quanto partilhamos a mesma inquietude em busca de um lugar no mundo, que carregamos as mesmas dificuldades, que as relações entre familiares e amigos são um dos fatores preditores da felicidade, que partilhamos a mesma Fé, porque a reconhecemos como o lugar em que Deus nos fala.