Arquidiocese de Braga -
15 março 2004
Meditações Sobre a Vida
D. Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz
\nMeditação sobre a vida
Ao falar sobre a necessidade da dedicação para que as crianças possam construir a sua identidade, alerto para condições anómalas onde elas nascem e crescem. Trata-se dum quotidiano amargo que não podemos ignorar.
Torna-se fácil cair em dois extremos igualmente prejudiciais para um desenvolvimento integral: o defeito ou o excesso da presença dos pais. Quer a carência quer a hiper-protecção prejudicam ou podem prejudicar.
Urge descobrir aquela estabilidade familiar, sinal do gosto quer Jesus mostrou em “estar com” para que a dedicação concreta se torne referência ou modelo.
Reflectir sobre esta atitude é mais uma proposta para dar qualidade de vida e quero aproveitar a ocasião para convidar a comunidade diocesana a efectuar uma leitura serena e atenta da Carta Pastoral que os Bispos Portugueses publicaram sobre a vida.
Em primeiro lugar solicito aos párocos e capelães que efectuem as diligências necessárias e habituais para que as famílias possam dispor dum exemplar. Só assim o objectivo que presidiu à elaboração desta Nota será atingido.
Na verdade, esclareço que não se trata duma nova tomada de posição do Episcopado sobre o aborto. Isto é uma consequência natural. Importa que os cristãos fujam à discussão apaixonada dos políticos e de alguns movimentos e sejam capazes de reflectir, serena e calmamente, sobre a vida como um dom de Deus.
Quisemos intitular esta Nota Pastoral com um nome, talvez invulgar, mas interpelativo. Trata-se duma Meditação sobre a vida e o meditar acontece no sereno ambiente que criamos para “ouvir” a verdade no meio de tantas afirmações parciais e desfocados. As grandes causas têm de ser pensadas e o grande erro da sociedade moderna reside na “debilidade “ dum pensamento pessoal para se deixar conduzir, insensivelmente, por vozes estranhas a uma consciência bem formada.
Os Bispos pretendem, essencialmente, situar-se num âmbito diferente da arena pública. Há momentos para estar aí e aí gritar e ouvir. Urge, porém, situar-se num patamar diferente e parar para reflectir. A Nota é uma ajuda. Não uma instrumentalização e aproveitamento fácil de pessoas menos prevenidas. Teremos de chegar ao ponto crucial da questão e encarar a realidade sem rodeios políticos ou confessionais. Não se trata de mais uma guerra religiosa. Só a vida vale e a esta se devem proporcionar todas as condições para um desenvolvimento no respeito e na dignidade que sempre encerra.
Será fácil, neste momento, colocar-se nesta atitude de “meditação”? A palavra é forte mas expressiva e, no acolhimento, porventura diferente, do conteúdo, denuncia a intenção dos Bispos. Trata-se dum contributo actual e com a importância das ideias que ajudam a compreender o rumo da história, confirmando-o ou rectificando. Muitos já apelidaram o século XX do “Século da Vida”.
Os atropelos continuaram e continuam a acontecer. Proclamar o direito à vida foi uma conquista dolorosa. Talvez o séc. XXI consiga eliminar as incoerências entre o proclamado e o vivido.
Que esta Nota Pastoral seja acolhida com a finalidade que a motivou: encarar serenamente o grande dom da vida para lhe dar a dignidade e respeito a que tem direito. As discussões e os diálogos são importantes. A meditação pode ser “a mais valia” que falta.
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