Arquidiocese de Braga -
28 maio 2004
À procura duma pastoral vocacional
D. Jorge Ferreira da Costa Ortiga
\nNão me situo – por temperamento e fé – no mundo dos pessimistas. Sei que reina um clima de apreensão e temor. Muitos se interrogam sobre o futuro da humanidade e da Igreja. Talvez seja mais verdadeiro se afirmar que são poucos os que se interrogam. Vive-se ao sabor do instantâneo que gera emoções e parece iludir-nos atrás duma cortina que esconde a realidade. Basta um pouco de futebol e esquecemos todos os problemas. Exagerei? Deixo uma pergunta.
Urge acordar para a nova realidade e situar-se num contexto que ninguém deveria ignorar. Os tempos não permitem uma visão cor-de-rosa.
Este cenário, aplicando-o à realidade social, teremos de o transportar para a Igreja e para a nossa de Braga. Não nos podemos iludir e adoptar a política ou pastoral da avestruz. Há realidades que não podemos ocultar e viver como se não nos inquietassem.
Neste Conselho Pastoral, preparando o próximo ano, iremos discernir os contornos dum Programa que sensibilize para a necessidade e urgência duma Pastoral Vocacional.
Deixo algumas considerações.
1. A Igreja não é realidade humana e será sempre conduzida por Cristo que não abandona a Sua grei. Sem fé e confiança no Espírito podemos ser uma sociedade mas nunca a Igreja de Jesus Cristo.
2. Esta certeza não nos dispensa de ser realistas. Os tempos mudaram e mergulhamos numa época de reduzido número de vocações sacerdotais, religiosas e missionárias. Não somos os mesmos, envelhecemos e as exigências pastorais são diametralmente opostas às solicitações do passado. Antes bastava a eucaristia, algumas devoções e um pouco de catequese. Hoje a pastoral torna-se mais específica e qualificada. Daqui emergem algumas ideias-força que terão de nortear a pastoral.
2.1. O Povo de Deus tem direito a uma assistência que permita a educação na fé, a celebração sacramental e a animação cristã das realidades terrestres.
2.2. O modo de o efectuar tem de ser diferente exigindo uma mudança radical por parte dos fieis e dos sacerdotes. Nem estes podem, particularmente ao fim de semana, esfalfar-se numa correria sem nexo e desmotivante, nem aqueles se devem refugiar em tradições impermeáveis a uma nova maneira de ser e agir.
2.3. A nossa pastoral tem de ser mais inter-paroquial e com uma colaboração activa dum laicado assumidamente cristão. Urge rever esquemas e ultrapassar resistências.
3. Para atingir esta nova maneira de ser e agir, há um itinerário que teremos de assumir. Trata-se de descobrir a vocação cristã como encontro com Cristo para um sentir-se enviado em Seu nome. É num húmus vocacional que devemos plantar ou semear a dinâmica do apelo para que muitos possam responder com alegria. As vocações de especial consagração são imprescindíveis. Como tornar o Ano Pastoral 2004-2005 um Ano Vocacional durante o qual, sem hesitações ou discusssões inúteis, as comunidades paroquiais e os movimentos se projectam em iniciativas de convergência diocesana? Exigir sacerdotes torna-se fácil; reconhecer o trabalho generoso das religiosas nas obras sociais é encorajador; fazer festa por verificar que ainda há quem se aventure a partir para anunciar a Boa Nova, é sinal de vitalidade. Mas, será suficiente? Não teremos de nos consciencializar doutras realidades? É bom que a Arquidiocese reconheça que este tempo das nomeações de sacerdotes para as paróquias e para os Serviços Centrais consiste num exercício com muito sacrifício e espírito de procura de soluções. Não temo o futuro mas o amanhã da Igreja responsabiliza-me e intranquiliza-me se não surgem novas vocações.
Por tudo o referido quero pedir que não sejamos pessimistas mas que invistamos. O substrato religioso ainda é muito valioso. Poderemos tirar dele autênticos tesouros. Mas, dum modo honesto, reconheçamos que tudo mudou. A fé permanece. O dever de a anunciar, celebrar e viver pode e deve mudar nas suas formas e linguagem.
Saibamos colocar-nos ao ritmo do Espírito.
Braga, 27.05.04 (Conselho Diocesano de Pastoral, R. Stª Margarida, 8)
+ Jorge Ortiga, A.P.
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