Arquidiocese de Braga -

13 março 2006

Trabalho para todos

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D. Jorge Ferreira da Costa Ortiga

\n É com profunda alegria que dou as boas vindas a todos os presentes e auguro que cada um experimente, nestes dias, a comunhão eclesial que queremos oferecer e viver como Igreja de Cristo. A Arquidiocese de Braga, acolhendo esta Semana Nacional, organizada pela Comissão Episcopal para o Laicado e Família, sente-se honrada e enriquecida no seu multissecular património a que a Semana oferecerá razões para se rejuvenescer e actualizar na tarefa de ser, em nome de Cristo, resposta aos problemas que o mundo do trabalho levanta. Estamos inseridos numa zona muito característica e marcada por fortes evoluções sociais. Já experimentamos momentos de progresso económico e, agora, estamos mergulhados na perplexidade dum futuro que não nos deixa indiferentes. Tivemos, num passado recente, quase um “pleno emprego” e, agora, caminhamos para índices de falta de trabalho que começam a ser alarmantes. O âmbito nacional desta semana não permite uma visão meramente local do problema. A alusão feita quer, só e apenas, reforçar a importância da temática escolhida pela Comissão Organizadora. Conscientes da gravidade da situação, iremos, em conjunto, fazer emergir pistas que co-responsabilizem na descoberta de soluções novas. Não me compete introduzir o tema nem quero intrometer-me nas considerações que os conferencistas nos proporcionarão. Perante a “verdadeira calamidade social” (L. E. 18), sobretudo em relação às jovens gerações (C.D.S.I. 287), ouso citar uma pequena passagem do Papa Pio XI, na carta encíclica Quadragésimo Anno. “Se a sociedade não forma realmente um corpo organizado, e a ordem social e jurídica não protege o exercício do trabalho; se as várias profissões, dependentes como são entre si, não trabalham de forma concertada e não se ajudam mutuamente; se enfim, e mais ainda, não se associam e colaboram juntos a inteligência, o capital e o trabalho, não pode a actividade humana produzir fruto. Logo não pode ser com justiça avaliada, nem remunerada equitativamente, se não se tem em conta a sua natureza social e individual” (Cf. C.D.S.I., n. 73). Estas palavras são verdadeiramente proféticas e, por isso, programáticas pela sua actualidade. Permitam que sublinhe dois aspectos. 1 – Não há soluções individuais. Só com uma articulação entre todos os sectores profissionais, com todos os seus intervenientes, conseguiremos encontrar a luz suficiente para ir caminhando na cautela de quem reconhece que o caminho se vai fazendo. Este pode não ser muito claro. Certa é, apenas, a exigência da unidade, envolvendo todos e destruindo qualquer tipo de egoísmo ou desejo de soluções particulares. A globalização é vantagem se gera a unidade e comunhão; se só alguns conseguem usufruir dos seus benefícios é uma ilusão e para a grande maioria uma miséria crescente. 2 – Leão XIII recordava que “não pode haver capital sem trabalho, nem trabalho sem capital” (R. Novarum) porque é “inteiramente falso atribuir só ao capital ou só ao trabalho aquilo que se obtém do concurso de ambos; e é de todo injusto que um deles, negando a eficácia do outro se arrogue a si todos os frutos” (Pio XI – Q. Anno). Se este binómio – trabalho e capital – foi sempre sublinhado pela Doutrina Social da Igreja, ele supõe um terceiro elemento: a inteligência. O trabalho como tarefa cansativa e o capital seu suporte estão a desafiar, permanentemente, a “inteligência”. Esta parece que está sempre subjacente ao realismo do trabalho e ao poderio do capital. Importa, porém, conceder-lhe maior atenção para que cada um desenvolva os seus talentos e intervenha na obra criadora ou re-criadora da natureza para bem de todos. A “inteligência” levará a trabalhar com outra consistência e, por muito que custe, reconhece que importa produzir – sem a obsessão de transformar as pessoas em máquinas – em quantidade e qualidade para enfrentar o jogo inevitável da concorrência. O capital submetendo-se ao exercício da inteligência, ultrapassa os limites do interesse pessoal e entra nos circuitos duma solidariedade efectiva capaz de proporcionar dignidade de vida a todos. Só a inteligência gera a inovação diversificada permitindo resultados a nível nacional e internacional. Por outro lado, ela reconhece a humildade de quem está sempre a aprender e, por isso, se concentra, duma maneira inovadora, na actividade laboral como exercício que dignifica e plenifica. Este exercício da “inteligência” permitirá formas novas de corresponsabilidade que o governo deveria estimular e nunca impedir para um desenvolvimento progressivo sem teias exageradamente burocráticas e com orientações concretas que permitam uma verdadeira justiça social onde todo e qualquer cidadão se sente imprescindível num contributo original – talvez a exigir suor e sacrifício – que dará mais felicidade a todos. Será o fenómeno do desemprego uma catástrofe inevitável? Não acredito que nos tenhamos de resignar à sua tirania. Na articulação de sinergias e num exercício que envolve a trilogia trabalho, capital e inteligência, encontraremos os caminhos novos e corrigiremos a panaceia dos antigos. Lamentar-se não conduz a nada. Com todos seremos uma sociedade a criar trabalho para todos. Auguro uma Semana Social Nacional onde a Doutrina Social da Igreja manifesta a sua actualidade e oferece condições a garantir razões de esperança. + Jorge Ferreira da Costa Ortiga, Arcebispo Primaz de Braga