Arquidiocese de Braga -
21 novembro 2006
O Sacerdote testemunha da esperança
D. Jorge Ferreira da Costa Ortiga
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Conselho Presbiteral
Jesus “porque permanece para sempre,
possui um sacerdócio eterno”;
fez a oferta “uma vez por todas
ao oferecer-Se a Si mesmo”. (Heb 7, 24.27)
Gostaria que o programa do Conselho continuasse a abordar a “pastoral presbiteral”. Cuidar dos sacerdotes é o específico dos nossos trabalhos.
A nossa identidade está em sermos continuadores do sacerdócio de Cristo e, como Ele, entregarmos a vida “uma vez por todas”. Reconhecemos que os momentos históricos nunca se repetem, mas a identidade da vocação, da missão, do ser, permanece. Este é o mistério e o ministério do nosso ser: a vida não nos pertence porque, voluntariamente, a colocamos ao serviço do Reino.
Cristo redimiu o homem, resgatando-o “a alto preço” (1 Cor 6,20;7,23; 1Pe 1,18-19). Aí se revela a dimensão do Seu amor, que é a fonte da Esperança e da Consolação. Mergulhados na história contemporânea, marcada por densas nuvens que dificultam a visão dum amanhã sereno, somos interpelados a “dar as razões” da nossa esperança, com mansidão, serenidade e respeito (1Pe 3,15).
A primeira grande proclamação e profissão de fé é esta: Cristo é a nossa esperança (Cl 1,27). Pela Sua morte e ressurreição fomos salvos “na esperança” (Rm 8,24) que não engana, nem desilude “porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo (5, 4-5). É precisamente no tempo da tribulação, em que “toda a criação geme” e nela também nós”( 8,22-23), que a esperança se acende. O convite que a Epístola aos Hebreus, o grande texto do sacerdócio de Cristo nos faz é: “Conservemos firmemente a profissão da nossa esperança, pois aquele que fez a promessa é fiel” (10,23).
No tempo da história conhecemos o “mistério da iniquidade” (2Tes 2,7) mas confiamo-nos ao “mistério da piedade” (1Tm 3,16) que é Jesus Cristo, cujo amor nos impele - caritas Christi urget nos (2Cor 5,14) - a esperar e a construir um mundo melhor. Para isso, a nossa vida só pode ser orientada no sentido do Evangelho da Esperança, para que a sua glória resplandeça na vida quotidiana, particularmente na sua dimensão social e familiar. Assim nos propusemos no programa pastoral “Família solidária”.
Para tornar a sociedade mais humana é necessário redescobrir o valor da vida em todos os momentos e circunstâncias. Necessitamos duma proposta positiva e dum compromisso sério. Não nos satisfazem os argumentos fáceis porque sabemos que o carácter sagrado da vida é o alicerce dum verdadeiro humanismo. Estar a favor dos indefesos e débeis não significa estar contra alguém, mas exige que, condenando inequivocamente o erro, ajudemos as pessoas – homens e mulheres – a reconhecerem o erro para encetarem uma vida nova. Não podemos cair em facilitismos morais que justificam todos os comportamentos em nome duma liberdade sem referências. O caminho do bem é sempre anunciado como suporte duma vida autenticamente humana mesmo que, muitas vezes, exija sacrifício e espírito de fidelidade aos valores.
Na entrega à causa da vida, a prioridade é a formação e esclarecimento das consciências, realizados no anúncio alegre da beleza de existir e no acolhimento, sereno e aberto, no ministério da reconciliação. Temos vindo a reflectir na importância do “confessionário” no nosso ministério. Torna-se urgente deixar-se motivar e vivenciar uma paixão capaz de inspirar calma e de formar para opções pessoais livres e responsáveis.
Em simultâneo, é imprescindível uma reflexão em grupo que ultrapasse a habitual pressa e o carácter sintético das homilias. Só em pequenos grupos conseguiremos, através da partilha das dúvidas, esclarecer as razões das propostas da Igreja. Verificaremos que elas nunca se opõem à ciência e que até vão encontrando maior eco mesmo em pensadores sem motivações ou preocupações religiosas. Há estudos que dão claras indicações nesse sentido e que conviria conhecer e assimilar.
Prosseguindo a reflexão sobre o ministério sacerdotal, que é vida generosamente entregue, fixemos a atenção na responsabilidade da hora presente: somos chamados a intervir com a serenidade da razão e a eloquência da fé.
Na Pastoral Sacerdotal fomos auxiliados pela generosidade e competência de D. António Santos. Vemo-lo partir prematuramente. Os desígnios de Deus são diferentes dos nossos. Quero interpretar este momento com imensa gratidão e, ao mesmo tempo, com votos sinceros de que o seu ministério continue a ser sinal do amor gratuito nas terras de Aveiro. Que nos perdoe o pouco que de nós recebeu; agradecemos a Deus pelo muito que nos deu.
Em ambiente de Família Diocesana que somos, ao iniciar mais um Conselho, quero expressar a mais profunda solidariedade com todos e cada um dos nossos sacerdotes. Alguns estão doentes, outros cansados das fadigas do ministério e do peso da idade, um ou outro um tanto desanimado. Empenhemo-nos para que cada um experimente, através da nossa solicitude fraterna e carinhosa, que é belo ser padre, que é maravilhoso viver o sacerdócio em tempos complicados como os nossos. O ambiente social nem sempre nos compreende e, muitas vezes, a perseguição não é realidade disfarçada. Em espírito de comunhão, prossigamos no anúncio da proposta do Deus- Amor, fonte da família solidária e duma sociedade diferente.
“Que o Deus da Esperança vos encha de toda a alegria e paz para que transbordeis de esperança pela força do Espírito Santo” (Rm 15,13); “sejam iluminados os olhos do vosso coração para saberdes que esperança nos vem do seu chamamento” (Ef 1,18); “Bendito seja Deus e Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação! Ele nos consola em todas as nossas tribulações, para que também nós possamos consolar aqueles que estão em qualquer tribulação, mediante a consolação que nós mesmos recebemos de Deus” (2Cor 1,3-4). “Alegres na Esperança, pacientes na tribulação” (Rm 12,12), sejamos pastores “segundo o Seu coração”.
Centro Cultural
21/Novembro/2006
Jorge Ferreira da Costa Ortiga,
Arcebispo Primaz
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