Arquidiocese de Braga -

1 fevereiro 2009

Universidade Católica na senda duma doutrina "nova"

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D. Jorge Ortiga

\nNo primeiro domingo de Fevereiro a Igreja, em Portugal, celebra o Dia da Universidade Católica. Trata-se duma oportunidade para que os fiéis se consciencializem da importância que ela detém no âmbito da missão eclesial. O ensino foi sempre importante. Na actualidade adquire um estatuto de função imprescindível. Urge, por isso, que a Universidade Católica se confronte com a sua identidade e se questione sobre o modo como exerce a sua missão em benefício da Igreja e da sociedade. Por outro lado, os católicos não podem marginalizar a Universidade Católica. Devem colocá-la nas suas intenções, preocupações e generosidade. Só um trabalho conjunto permite um verdadeiro serviço eclesial e cria credibilidade para que mais jovens se inscrevam nos seus cursos.
A liturgia proporciona um maravilhoso contexto para uma breve reflexão a propósito do tema escolhido para este ano. “Formar para a ética e a verdade”. Com efeito, a presença de Jesus na Sinagoga de Cafarnaum, que poderemos exageradamente considerar como uma “universidade judaica”, leva ao reconhecimento dos presentes que Ele era portador duma doutrina nova e ensinada com autoridade. Na noite escura da cultura moderna impõe-se que ousemos, sem critérios de superioridade, aspirar a um ensino com estas duas qualidades: “nova” porque diferente e “com autoridade” porque com competência e excelência.
Estas características devem marcar todo o processo educativo. Este ano, porém, fixamos o nosso pensamento no formar para a verdade e para a ética como compromisso para as estruturas universitárias e como certeza para os católicos, e talvez todos os portugueses, de que isso acontece em todos os Centros e Faculdades.
Esta formação supõe uma noção muito clara destas duas realidades. Comecemos pela verdade.
Alicerçados num pensamento helénico a Igreja católica apropriou-se duma definição que importaria rectificar. S. Tomás de Aquino sintetizou-a afirmando que se trata duma “adequação da mente à realidade”. Concordância entre o pensamento e aquilo que ele pode descortinar. Acontece que o pensamento Bíblico vai mais longe. Com efeito, no diálogo entre Jesus e Pilatos, descrito por S. João, Jesus não responde à questão “O que é a verdade?” (Jo. 18,38).
A não resposta não significava desinteresse ou ignorância. Era ruptura com o modo de ver as coisas e os acontecimentos. A atitude de Jesus está a afirmar que a verdade não é algo para se dizer mas é uma pessoa. Não o que é mas quem é a verdade. A resposta será Ele é a verdade em quem se deposita uma confiança radical.
Actualizando esta doutrina, os cristãos mais do que dizer o que é a verdade, devem ser a verdade para os outros gerando confiança, segurança, fidelidade, suporte, amparo. Importa, por isso, suscitar uma cultura de confiança no outro num tempo em que poucos são aqueles que oferecem essa confiança a nível interior ou exterior. Neste relacionamento de verdade aparece a certeza de poder confiar e acreditar.
Não haverá aqui uma novidade desconhecida que importa cultivar e estimular? Já S. Tomás dizia: “Os homens não seriam capazes de viver juntos, se não tivessem confiança uns nos outros, isto é, se não se dissessem a verdade” (citado em C.I.C. 246 a). A partir desta confiança absoluta é que compreendemos que a verdade é “rectidão da acção e da palavra humana”. Teremos por isso de “mostrar-nos verdadeiros nos actos e em dizer a verdade nas palavras, evitando a duplicidade, a simulação e a hipocrisia”. Não será urgente reimplantar esta cultura no relacionamento mútuo, nos discursos políticos, nos comportamentos dos membros da Igreja? A verdade não exigirá a honestidade em tudo quanto dizemos e fazemos? Não precisaremos de nos examinar sobre as verdadeiras ofensas à verdade que encontramos num clima do “vale tudo” e por isso quotidianamente nos confrontamos, mesmo em plenos Tribunais, com o falso testemunho, o perjúrio, a ofensa à reputação das pessoas, os juízos temerários, a maledicência, a calúnia, a lisonja, a adulação, a ironia, a jactância e particularmente a mentira. Quantas palavras e atitudes não destroem a reputação e a honra do próximo?
Que a Católica ao formar para a verdade seja um testemunho de que Deus é “o verdadeiro” (Rom. 3-4) e os cristãos – e todos os homens – são chamados a viver e dar testemunho da verdade (Jo 18, 37).
Uma palavra sobre a ética. Formar para a ética é aceitar que a vida, como atitude de confiança radical no outro, tem as suas implicações éticas. Se a verdade falta na sociedade, a ética é o suporte da esperança e o alicerce duma revolução que importa fazer.
Para ser breve recorro ao significado dos dicionários onde se afirma que ética vem de Ethos e que significa o “hábito”, a “roupa” que vestimos e que se entende melhor quando se compara com a outra palavra grega Êthos que significa “casa”.
A ética é assim esta maneira de habitar na casa, de se mostrar num espaço relacional com atitudes e comportamentos característicos duma família que tem a sua casa.
Em Ano Paulino recordo quanto ele solicitava aos Colossenses, “como eleitos de Deus, santos e amados, revesti-vos de sentimentos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de paciência, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos mutuamente, se alguém tiver razão de queixa contra o outro. Tal como o Senhor vos perdoou, fazei-o vós também. E, acima de tudo, revesti-vos do amor que é o laço da perfeição. Reine em vossos corações a paz de Cristo, à qual fostes chamados num só corpo. E sede agradecidos. A Palavra de Cristo habite em vós com toda a sua riqueza: ensinai-vos e admoestai-vos uns aos outros com toda a sabedoria: cantai a Deus, nos vossos corações, o vosso reconhecimento, com salmos, hinos, e cânticos inspirados. E tudo quanto fizerdes por palavras ou por obras, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando graças por Ele a Deus pai” (Col. 3, 12-17).
Formar para a ética é, deste modo, criar a convicção dum mundo como “casa” comum onde, por isso, nos “revestimos” de comportamentos e atitudes que mostram que a Palavra de Deus “habita” em tudo quanto fazemos. O mundo moderno não necessitará desta visibilidade no quotidiano dos cristãos, dos empresários, dos professores, dos médicos, dos políticos, dos autarcas, dos trabalhadores?
Voltando a Jesus que ensinava uma “nova” doutrina e com “autoridade”, vamos rezar para que a Católica ensine esta doutrina nova, porque alheia ao comportamento de muitos, que o faça com a autoridade duma competência motivadora de mais e melhores apoios e que os cristãos a escolha e frequentem.

Braga, 01-02-2009
+ Jorge Ortiga, A.P.