Arquidiocese de Braga -
7 junho 2009
Deus vem ao nosso encontro na Palavra
D. Jorge Ortiga
Sameiro 2009
Com Maria, mãe da Igreja, queremos compreender a perene vitalidade da Palavra de Deus. A Igreja, como expressão visível de Cristo, deve concretizar o mandato de “fazei discípulos de todas as nações”. A missão não está encerrada. Como nunca, reafirmamos a urgência, a absoluta necessidade de “fazer discípulos”, como tarefa a realizar “dentro” e “fora”.
“Dentro” da Igreja, nas diferentes comunidades, torna-se imperioso abandonar um certo “conformismo” ou “serena tranquilidade” que consiste num mero repetir de hábitos e tradições. Não me canso de insistir nesta alteração de rumo pastoral.
Corro o risco de repetir as mesmas coisas. Só o faço na convicção de que o caminho Pastoral deve ser mais evangélico, ou seja, gerador de encontro com a Palavra e motivador duma Igreja que se impõe pela novidade que o mesmo Evangelho encerra. Estamos longe desta Igreja Evangélica.
Duma experiencia evangélica “dentro” da Igreja teremos de percorrer os caminhos do mundo. Estamos adormecidos e vamos fazendo aquilo que os outros desejam, ou seja, reproduzimos rotinas que consolam alguns mas afastam muitos outros. Não conseguimos ser “fermento” através duma presença evangélica que vai incomodar muitas situações e não permitirá que certos males da sociedade hodierna persistam nos mais variados âmbitos, nomeadamente, na justiça, na educação, na economia, na saúde, na vida administrativa. Muitos alegram-se com o nosso silêncio e a pouca incidência da mensagem evangélica no real quotidiano.
O Evangelho recorda que “não recebestes um espírito de timidez”. Os momentos difíceis da história exigiram profetas como anunciadores de propostas credíveis e denunciadores de injustiça e corrupção. Estamos numa época que reclama da Igreja uma maior capacidade profética capaz de arriscar tudo para ganhar - como S. Paulo – alguns para Cristo e para a Igreja.
O contexto social que nos rodeia está a exigir uma intervenção mais persistente. Parece-me que nos demitimos com muita facilidade. Surgem leis contraditórias dos nossos sentimentos e aparecem comportamentos discriminatórios e continuamos impávidos e serenos. Parece-me que estamos a construir a melhor história. Não nos apercebemos de comportamentos que minam a sociedade cristã? É hora de, respeitando a liberdade de todos, afirmarmos a nossa identidade e os nossos direitos.
Seremos capazes de compreender o que, no Espírito Santo e perante o modelo de vida pessoal e comunitária que é a Santíssima Trindade, é pedido à Igreja? A Arquidiocese de Braga e o país necessitam duma presença mais activa para que a esperança continue presente na vida de todos e, particularmente, dos mais pobres e esquecidos.
Perante este desafio, desinstalador e programático, a liturgia de hoje conduz-nos a uma dupla descoberta.
Na primeira leitura, víamos como o povo recordava uma história onde se reconhecia a estima pela Palavra de Deus. Perante o reconhecimento de que, no meio de tantas palavras, a Palavra de Deus é única – “Ouviu-se porventura palavra semelhante” –, o mesmo povo afirmava, em simultâneo e como resposta verdadeira, “que povo escutou como tu a Voz de Deus.”
Estamos em Peregrinação Arquidiocesano e no final do primeiro ano dedicado ao “Tomar conta da Palavra que toma conta de nós”. Será que aconteceu alguma coisa no reconhecer a centralidade da Palavra na nossa vida e na vida das comunidades? Somos povo que escuta, como ninguém, esta Palavra de valor impar e inconfundível?
Mais do que nunca somos desafiados a fazer com que o Evangelho não seja mera memória de Cristo. Tem de tornar-se história vivida e, como tal, transformadora do mundo por acção do ressuscitado. Ele é a nossa única norma ou regra, é o estatuto fundante da vida de cada comunidade e cada cristão. Só com ele conseguiremos recuperar a originalidade e actualidade do cristianismo.
A Sagrada Escritura é o grande dom que os cristãos descobrem para si e que podem e devem oferecer à sociedade, condividindo-o com homens e mulheres que procuram razões para viver com plenitude. Aqui e agora, com os nossos estilos e opções de vida, devemos gritar a beleza desta única alternativa a outras propostas sedutoras que, com ousadia, teremos de colocar no coração da sociedade.
Na Palavra e pela Palavra, gostaria de encerrar esta reflexão com S. Paulo. Como ele aos Romanos também eu gostaria de solicitar aos nossos cristãos: “Não vos amoldeis às estruturas deste mundo, mas transformais-vos pela renovação da mente, a fim de distinguir qual é a vontade de Deus: o que é bom, o que lhe é agradável, o que é perfeito” (Rom. 12.2).
Tivemos um Ano Paulino que está a chegar ao seu encerramento. Foi proposta uma caminhada com S. Paulo que deve prosseguir. Com Paulo deixamos que Deus tenha vindo ao nosso encontro com a Palavra. Em cada família continuemos a caminhar. Estruturemos a vida com vontade de imitação. Daí que aproveite esta peregrinação Arquidiocesana para pedir que este ano deixe marcas.
A Senhora do Sameiro, rosto visível da única Mãe Imaculada de Cristo, nos conceda a alegria de considerar a Palavra de Deus como o melhor que nos é oferecido no inicio deste novo milénio. Que, por outro lado, nos entusiasme no anuncio graudioso desta mensagem maravilhosa que a todos compromete. Não paremos. Com Maria, continue-mos a caminhada.
Sameiro, 07-06-2009
† Jorge Ortiga
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