Arquidiocese de Braga -

5 junho 2011

'SEREIS MINHAS TESTEMUNHAS'

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Colaborador

Homilia de D. Jorge Ortiga na peregrinação à Senhora do Sameiro.

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‘SEREIS MINHAS TESTEMUNHAS’

Peregrinação à Senhora do Sameiro

 

Ao celebrar a Ascensão de Cristo ecoa em nossos corações o desafio lançado aos apóstolos: “Sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e na Samaria e até aos confins da terra” (Act 1, 11). No horizonte dos confins da terra, a responsabilidade é única e extensiva a todos os crentes: “Ide e ensinai todas as noções…, ensinando-as a cumprir tudo o que vos mandei. Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos” (Mt 28, 20).

Uma Igreja sem consciência missionária não existe. O cristão vive configurado com Cristo e torna credível, por palavras e obras, o Reino admirável de Deus. A presença do Espírito Santo confirma os diversos modos de anunciar Cristo ressuscitado. Numa sociedade cada vez mais globalizada onde a informação se espalha rapidamente, a Igreja não pode perder o ponto da meada, de ser pioneira no seu modo de comunicar as verdades da fé. Ser testemunha de Cristo em toda parte é um desafio que se impõe a toda a Igreja neste início de século. Testemunhas não apenas nas cidades terrenas (Jerusalém, Judeia, Samaria) mas também nas grandes cidades digitais do nosso tempo (Web, facebook, youtube…).

O Santo Padre, neste 45º Dia Mundial das Comunicações Sociais, consciencializa a Igreja para a beleza desta novidade: “Vai-se tornando cada vez mais comum a convicção de que […] hoje a profunda transformação operada no campo das comunicações guia o fluxo de grandes mudanças culturais e sociais. A comunicação digital está a marcar uma nova maneira de aprender e pensar, com oportunidades inéditas de estabelecer relações de comunhão, entre pais e filhos, novos e velhos, de diálogo entre os povos. Daí a importância de colocar a “verdade, o anúncio e a autenticidade de vida” nestes canais.

A Igreja Povo de Deus é desafiada a perceber que a era digital é um fenómeno incontornável, a assumi-los transparentemente como meios de testemunho credível do Evangelho, fazendo deles um modo próprio de comunicar e partilhar a fé. A comunicação digital é uma ferramenta imprescindível para Igreja fazer com que a vida de Deus chegue ao centro da vida do Homem, dialogando e apresentando Jesus Cristo como esperança para os crentes.

É ilusória a pretensão de querer competir a todo o custo com a Babel massificada e ambígua de muitos conteúdos presentes na televisão, na internet ou nas redes sociais. Numa cultura povoada pelo imediatismo, sensacionalismo e pela ridicularização da vida íntima e pessoal das pessoas, tudo o que é Bom e Belo, que ajuda o ser humano a tornar-se mais humano e humanizado, permanece obscurecido e secundarizado pela agenda da comunicação digital. O mundo da comunicação terá de ser sempre um meio e nunca um fim para tornar presente os valores do Reino que Cristo anunciou e a Igreja continua a testemunhar.

Para além das virtualidades, são notórios alguns riscos:

- a informação disponibilizada carece de acompanhamento pessoal e permanente;

- o afastamento das comunidades reais (urbanas ou rurais), do contacto directo e essencial com os sacramentos;

- a satisfação de procurar e encontrar receitas espirituais para alcançar de forma fácil a felicidade individual (“consumo virtual”);

- a proliferação de sites com doutrinas pouco católicas ou cristãs ou outras que misturam elementos gnósticos doutras religiões com a fé cristã;

- substituição do atendimento e da escuta pessoal por estas redes impessoais anónimas.

Estes são alguns elementos que conduzem à perda de referências visíveis, à confusão teológica e moral da fé cristã, à proliferação quantitativa de informação, muitas vezes sem qualidade, que faz com que as pessoas sejam capazes de distinguir o essencial do acessório, levando-as a escolhas que colocam em causa a dignidade da pessoa.

Estes limites não podem ser entrave à proposta da nova evangelização através destes grandes areópagos. Num tempo de tantas opções disponíveis urge colocar Deus nestes circuitos marcando a diferença que a verdade exige através de vidas marcadas pela autenticidade. Nesta transmissão digital não só é possível como imperioso efectuar uma proposta clarificadora da fé. Dar a conhecer e transmitir Cristo vivo a todas as pessoas e cibernautas, é já denunciar tudo o que coloque em causa a pessoa humana, na sua verdade, unicidade e dignidade inviolável.

Na configuração de um perfil, sempre como meio de evangelização e nunca como fim da missão da Igreja, está a disponibilidade e a abertura para o encontro pessoal com a comunidade de modo que se possa interpelar para a consciência de pertença à Igreja. O cristianismo será sempre uma experiência presencial onde o amor circula e a Palavra une e gera discípulos que se reconhecem na fracção do pão e na celebração dos sacramentos que dão sentido à vida do crente.

A mensagem do S. Padre para este Dia Mundial das Comunicações sociais interpela o nosso caminho já percorrido e o que ainda é possível fazer na comunicação dos conteúdos da nossa fé. Temos investido na partilha e no dar a conhecer o que esta Igreja Particular é. Temos um conjunto de ferramentas que são imprescindíveis para a apresentação da nossa vida eclesial e para o diálogo com a sociedade e com a cultura.

Importa que as comunidades redescubram esta maravilha, este dom colocado ao serviço do Evangelho e da humanidade. Ao muito que se faz, devemos acrescentar o contributo imprescindível de cada um. Se a Igreja em determinadas áreas foi e é pioneira e inovadora, neste novo mundo não nos é permitido assistir e tecer um mero reconhecimento dos perigos e desafios desta descoberta humana. É um caminho a percorrer com novo empenho e maior sentido de corresponsabilidade. O encontro com Cristo pela Palavra gera a alegria do anúncio.

Neste Santuário Mariano, como em tantos outros, teremos de encontrar Maria como aquela que recebe um projecto de Deus e vai apressadamente comunica-lo à sua prima Isabel. A lentidão da caminhada e a alegria do encontro suscita diálogo humano onde as maravilhas de Deus são cantadas.

Com Maria, louvemos o Senhor por quanto fomos capazes de realizar. Com ela, sejamos missionários do amor, do acolhimento, da verdade e da autenticidade de vida e de fé.

 

Sameiro, 5 de Junho de 2005

 

Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz