Arquidiocese de Braga -

30 junho 2014

D. FRANCISCO SENRA COELHO EM ENTREVISTA

Fotografia

Teve lugar ontem, às 16h00, na Sé Catedral da Arquidiocese de Évora, a ordenação do novo bispo auxiliar de Braga, D. Francisco Senra Coelho. Em entrevista ao Diário do Minho, o prelado promete em Braga uma ação pastoral de proximidade com o Arcebispo D. J

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Teve lugar ontem, às 16h00, na Sé Catedral da Arquidiocese de Évora, a ordenação do novo bispo auxiliar de Braga, D. Francisco Senra Coelho. Em entrevista ao Diário do Minho, o prelado promete em Braga uma ação pastoral de proximidade com o Arcebispo D. Jorge Ortiga, com o corpo clerical diocesano e com todas as pessoas, dando preferência às famílias, especialmente às que enfrentam maiores dificuldades e aos que se encontram na “periferia” existencial.

Do ponto de vista pessoal, D. Francisco Senra Coelho não esconde a sua alegria de regressar às origens, já que é filho de pais naturais de Adães, Barcelos.  Mesmo ordenado padre em Évora e com uma vida pastoral de 28 anos no Alentejo, o novo bispo auxiliar de Braga afirma: «Sempre tive uma alegria muito grande, um santo orgulho de me sentir bracarense».

Diário do Minho (DM) - Depois da surpresa da nomeação como encara a nova missão que a Igreja lhe pede?

D. Francisco Senra Coelho (DFSC) - Encaro esta nova missão como um desafio ao meu crescimento humano, espiritual e cristão na medida em que é uma missão que me pede muita autenticidade no ser cristão. É, portanto, uma oportunidade que a Igreja me dá de eu amadurecer mais na fé, para testemunhar com toda a autenticidade a minha vivência com Cristo, para que na missão que me é confiada transpareça essa mesma experiência de vida. Sobretudo destaco o crescer no ser, para que quem se encontre comigo se encontre com Cristo. Que eu seja um lugar de Cristo, um homem de Deus.

De facto, quando se procura um diácono, um sacerdote, um bispo, ou um simples cristão espera-se a transparência de Deus e não o opaco do opróbrio. É deixar que Deus me trabalhe e me faça, na humildade e simplicidade, dom d’Ele para os outros.

DM - Já conhece as necessidades pastorais da Arquidiocese de Braga?

DFSC - Na última assembleia plenária da Conferência Episcopal estive um tempo longo de diálogo com D. Jorge Ortiga e também mantive uma conversa pessoal com D. António Moiteiro. E, como se sabe, a minha raíz familiar é minhota (de Barcelos) e nunca deixei de ter no horizonte da minha vivência a Arquidiocese de Braga, onde me desloquei mensalmente nestes anos que estou no Alentejo. Como estudante de Teologia ia ao Minho trimestralmente,  como padre ia mensalmente visitar os meus pais a Adães. 

Conheço relativamente bem a Arquidiocese de Braga, os seus desafios, a sua grandeza e ao mesmo tempo algumas dificuldades. 

DM - O que é que esta diocese pode esperar de si?

DFSC - O bispo auxiliar que agora vai para Braga, na Arquidiocese de Évora há 28 anos. Desde o dia em que foi ordenado, foi pároco de uma comunidade grande e, ao mesmo tempo, com uma ação sócio-caritativa muito desenvolvida, com um grande centro social paroquial e é pároco de três paróquias: duas rurais e uma urbana. Fui, curiosamente, sempre pároco da mesma paróquia citadina que fui, em certa medida, o fundador. A paróquia existia canonicamente desde 1967 mas, quando cheguei em 1986, não tinha nenhuma estrutura, nenhuma igreja paroquial.  Celebrei durante muitos anos em garagens, armazéns, escolas primárias. Durante mais de 10 anos celebrei em mesas de fórmica, sem igreja mas construindo uma Igreja. 

Braga, por isso, pode esperar um bispo com esta experiência pastoral, que vai envolver todos os colegas sacerdotes na proximidade de irmão, com a consciência de que tem muito para aprender.  Na primeira fase, vou para aprender, tentando conhecer e descobrir esta nova realidade, já que a experiência da Arquidiocese de Évora, numa região como o Alentejo, é muito distinta da vivência da Arquidiocese de Braga. Mas a proximidade será a de irmão, de amigo, com grande dedicação aos sacerdotes, de grande proximidade às famílias, especialmente às que enfrentam maiores dificuldades. Terei uma grande atenção para com o trabalho das vocações, dedicando-me, preferencialmente, aos mais pobres e aos que porventura sejam “periferia” existencial e que busquem Deus.

DM - Como chegou ao lema episcopal que adota: “Que Ele cresça e eu diminua”?

DFSC - Quando me ordenei diácono, em dezembro de1985, na cidade de Estremoz, escolhi como tema do meu diaconado, exatamente esta frase e a pagela que ofereci exibia o fresco paleocristão das catacumbas de Roma com Jesus a lavar os pés aos discípulos. 

Quando fui ordenado presbítero em 1986, no dia 29 de junho, dia de S. Pedro – tal como vai ser a ordenação episcopal e, curiosamente, sendo eu originário de uma paróquia que tem como padroeiro S. Pedro, como é Adães – pensei que não deveria mudar o lema. E agora continuo com o mesmo, para que Ele cresça na unidade e na comunhão e eu diminua na dádiva da minha vida identificando-me com Cristo, Bom Pastor e servo de todos.

DM - Falando das suas origens minhotas. Há hoje pessoas que questionam por que razão um jovem da Arquidiocese de Braga, que frequentou o seu seminário, acabou como padre da Arquidiocese de Évora?

DFSC - É muito simples. Fiz uma experiência gratificante em Braga. Tenho muita alegria nos amigos que fiz no meu tempo. Vivi em Moçambique até aos 14 anos, onde fiz o meu Batismo e onde convivi muito de perto com o senhor D. Eurico Dias Nogueira, que era bispo da Diocese de Vila Cabral, onde eu vivia com os meus pais. Quando vim para Portugal queria já ser sacerdote missionário. Trazia na minha mente, regressar a Moçambique, às minhas origens moçambicanas. Pensei nos Combonianos, pensei nos Espiritanos, pensei na Sociedade Missionária... Entretanto, nesses anos vivia-se o regresso dos missionários, em virtude da guerra civil em Angola, dos problemas em Moçambique... Uns regressavam a Portugal outros eram enviados para o Brasil e para outros países da América do Sul. Foi-me aconselhado em não pensar em ir para Moçambique, pois a situação era muito complexa. Pensei, então, ir para uma Igreja pobre e foi-me sugerida a Igreja do Alentejo. E assim fui, tendo sido ordenado sozinho. Não havia mais nenhuma ordenação. Fui ordenado por D. Maurílio Gouveia, por D. David que me acolheu na diocese no primeiro ano de Teologia,  e por D. Eurico Dias Nogueira que, me conhecendo, veio à minha ordenação. 

Por isso, vim para o Alentejo por um motivo: por uma Igreja mais pobre. Acabei por oferecer a minha vida aqui. 

DM - A sua vinda para Braga sente-a como um regresso?

DFSC - Vivi até aos 14 anos em Moçambique. Entre os 14 e os 18 anos, em Braga e dos 18 até ao presente, em Évora. Estive apenas quatro anos entre Barcelos e Braga. Sou alguém com raízes minhotas mas com um amadurecimento da fé no Alentejo. 

Posso dizer que regresso às minhas raízes... que me reencontro com as minhas raízes, dos meus avós, bisavós, dos meus pais... Será um estar em casa de onde eu nunca saí, porque nunca deixei de ser minhoto. Sou minhoto de leite materno. A minha cultura, a minha maneira de rezar, de me exprimir é minhota. Ao longo destes anos nunca deixei de ir a Braga e de estar presente ao lado do meu pai e da minha mãe. Agora só da minha mãe, com o falecimento do meu pai. É, por isso, um regressar às origens.

DM - O que representará sempre para si Évora?

DFSC - Évora é uma experiência, uma realidade da qual não me despeço. Sei que fico no coração dos eborenses que me acolheram e que me abraçam constantemente.  Eles também vão no meu coração.  Évora é uma referência de Igreja. 

Sinto a minha vida como que amassada e torcida aqui no Alentejo. Braga é um serviço e, ao mesmo tempo, um amor muito grande, porque vou para a terra dos meus bisavós, avós, dos meus pais... Vou para a minha cultura. Pois, embora não tenha estado muito tempo a viver no Minho, foram quatro anos decisivos – muito bonitos e felizes – na minha vida. 

Há uma alegria enorme em regressar.  Faço-o com muita esperança e com um desejo muito grande de servir e amar, no berço da minha fé. Porque foi nessa vivência minhota que eu recebi a fé pela minha família.

DM - Mas foi em Évora que se construiu?

DFSC - A minha fé, a fé da Igreja, dom de Deus, é a fé que me foi transmitida no seio da minha família pelo meu pai, pela minha mãe, pelos meus avós. Foi vivida e convivida com os meus tios, com os meus primos. Foi depois esclarecida e amadurecida no Alentejo. Mas a semente, a raiz,  é minhota. 

DM - Poderá ser entendido, então, como um cristão minhoto, bispo alentejano?

DFSC - Aqui no Alentejo sempre distinguiram em mim a minhas raízes minhotas. A minha maneira de ser padre no Alentejo nunca camuflou a minha origem. Sempre fui detetado como minhoto. Sempre tive uma alegria muito grande, um santo orgulho de me sentir bracarense.  Quando vou a Braga e Barcelos sinto-me em casa. Senti-me muito amado no Alentejo e sinto-me muito querido pela minha terra na pergunta: “Quando voltas?”. No fundo sou um minhoto missionário no Alentejo.

D. Francisco José Senra Coelho nasceu em 1961.  Fez a sua formação sacerdotal no Seminário Maior de Évora e no ISTE, concluindo os seus estudos filosóficos no Pontifício Ateneu Antoniano e teológicos na Pontifícia Universidade Salesiana. Licenciou-se em História da Igreja na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma. Obteve doutoramento em História Civil na Phoenix International University. Foi professor de História da Igreja no Instituto Superior de Teologia de Évora e pároco na mesma cidade. É membro da Sociedade Científica da Universidade Católica Portuguesa e do Cabido da Basílica Metropolitana de Évora e Académico correspondente da Academia Portuguesa da História. É membro do CEHR.

DM 28 de Junho de 2014