Arquidiocese de Braga -

25 fevereiro 2016

As respostas de Francisco aos "pequeninos"

Fotografia DR

DACS com Rádio Vaticano*

É lançado hoje em Itália o livro que compila as respostas do Papa a centenas de cartas escritas por crianças. Ternura, honestidade e simplicidade marcam a publicação.

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As respostas do Papa Francisco a cartas enviadas por crianças de todo o mundo vão ser compiladas em livro com o título “Querido Papa Francisco”. O lançamento acontece já hoje em Itália e a 01 de Março noutros países.

As crianças que escreveram ao Pontífice têm entre 6 a 13 anos e são oriundas de todos os continentes. Pedidos de ajuda, conselhos, dúvidas e questões existenciais constituem parte do teor das cartas.

De acordo com o Secretariado Nacional da Cultura, referindo o texto de apresentação da editora, “o Papa Francisco responde com palavras simples e extraordinariamente íntimas, como um pai extremoso, acolhendo e confiando aos mais pequenos a sua reflexão sobre a vida e sobre a fé”.

O título da edição italiana, “L’amore prima del mondo”, faz referência a uma pergunta sobre o que fazia Deus antes de criar o mundo. “Amava”, respondeu Bergoglio.

Em Maio de 2015, a Loyola Press, editora dos Jesuítas, propôs a ideia a Francisco, que logo a aceitou. A partir daí foram recolhidas 259 cartas de 26 países, incluindo de escolas provisórias que acolhem refugiados sírios.

A distribuição da obra, para já disponível em inglês e espanhol, está a cargo da Loyola Press. Em Itália, está sob a alçada da Rizzoli. Inicialmente, o livro vai ser lançado em Itália, Espanha, México, Polónia, Indonésia, Filipinas e Índia. Ainda não há data oficial para a publicação em língua portuguesa.


“Perguntas difíceis”, respostas simples

O padre Paul Campbell, editor do livro, confessou à Rádio Vaticano que uma forma simples de descrever a obra é assumir que “as pequenas crianças têm grandes questões”. O jesuíta revelou ainda que, apesar de serem questões de pessoas de tenra idade, são questões “muito, muito profundas”, às quais o Papa Francisco confessou ser “terrivelmente difícil responder”.

“O Papa Francisco quer chegar a crianças e adultos, a todos os que sofrem – ou seja, todos nós – para dizer que não entende o sofrimento, que não o consegue explicar, mas que acredita que Jesus sofreu por nós e que essa é a única coisa que lhe dá esperança e conforto”, explicou, realçando a “sensibilidade profunda” do Papa em relação ao sofrimento das crianças.


Se o Papa pudesse fazer um milagre...

Poucas coisas comovem tanto o Papa como o sofrimento das crianças. William, dos Estados Unidos, pergunta o que faria Bergoglio se pudesse fazer um milagre. "Querido William, curaria as crianças. Ainda não consegui entender porque é que as crianças sofrem. Para mim é um mistério. Não sei explicar. Interrogo-me sobre isso. Rezo sobre esta pergunta: por que é que as crianças sofrem? É o meu coração que põe a pergunta. Jesus chorou, e chorando compreendeu os nossos dramas. Eu procuro compreender. Se pudesse fazer um milagre, curaria todas as crianças".

Francisco também fala de milagres na resposta concedida a Joaquin, do Peru, que lhe pergunta o porquê de não existirem mais milagres. "Mas quem te disse isso? Não é verdade! Há milagres a acontecer agora mesmo: o milagre de pessoas que sofrem e não perdem a fé, por exemplo. Ou os mártires do Oriente, que se deixam matar em vez de negar Jesus. Não, não são milagres «espetaculares». Nunca vi ressuscitar um morto... Mas tenho visto muitos milagres diários na minha vida".

A Lucas, o menino australiano que perdeu a mãe, o Papa garantiu que a mãe está no céu, mais bonita do que nunca. "Ela vê-te e sorri para ti, seu filho. De cada vez que te vê, e se te portas bem, a tua mamã fica contente. Se não te portas bem, ela quer-te bem na mesma e pede a Jesus para te portares melhor. Pensa assim a tua mamã: bela, sorridente e cheia de amor por ti”, escreveu.

Não somos prisioneiros do sofrimento, Jesus venceu o mal

Mohammed, que escreve da Síria, fala do sofrimento, das "pessoas más que fabricam armas e que travam guerras". “Há pessoas que têm ódio no coração. Isso é terrível, mas este sofrimento está destinado a terminar. Não somos prisioneiros do sofrimento, até porque Jesus veio para nos salvar e derrotou o diabo".

"O diabo é um perdedor, é como um cão amarrado que ladra e rosna, mas se não te aproximares dele, não consegue morder-te", disse o Papa a uma menina peruana.

E em resposta a uma criança do Zimbabwe, Francisco observou que Jesus derrotou o mal na cruz. “O diabo, repito, foi derrotado e por isso tem tanto medo da cruz".

Deus: misericórdia e salvação

RizzoliA Emil, da República Dominicana, o Pontífice garantiu que os nossos parentes estão no céu, "não estão longe de nós", "rezam por nós e cuidam de nós com todo o carinho."

A Michael, da Nigéria, que pergunta o que pode fazer para resolver conflitos no mundo, respondeu francamente que "não é com uma varinha mágica". Para ajudar, "temos de convencer todos de que a melhor maneira de ganhar uma guerra é não travá-la. Não é fácil, eu sei. Mas eu tento. Tenta também."

Uma criança de nacionalidade chinesa questionou se o seu avô, que não é católico, iria para o Céu. "Jesus ama-nos tanto que quer que todos vamos para o céu. A vontade de Deus é que todos sejam salvos”, respondeu o Papa. A certa altura, segundo o Pontífice, uma senhora foi ter com S. João Vianney, desesperada porque o marido havia cometido suicídio ao saltar de uma ponte. "Estava desesperada porque imaginava que o marido teria ido certamente para o inferno. No entanto, o Santo disse-lhe que entre a ponte e o rio encontrava-se a misericórdia de Deus."


O que significa ser Papa?

Muitas das cartas fizeram referência à vida pessoal de Francisco, e àquilo que significa ser o Papa. Francisco não fugiu às questões e respondeu com naturalidade, dizendo em primeiro lugar que não sabe reconhecer-se de outra forma que não com um sentimento de paternidade. "Poderia apenas pensar em mim e não ser como um pai. Mas faz-me feliz estar com as pessoas, isso faz-me feliz. Se não posso estar com as pessoas, estou com Jesus e falo-Lhe das pessoas."

A Josephine, que perguntou a Francisco qual o seu lugar favorito para rezar, respondeu que "gosta de rezar em qualquer lugar". "Posso orar enquanto caminho, ou mesmo quando vou ao dentista. Encontro Deus em qualquer lugar. A oração deve vir do coração, porque Ele também nos ouve com o coração."

Tom, do Reino Unido, pergunta: qual é a coisa mais difícil para o Papa Francisco? "Ter que mandar embora alguém com um trabalho de responsabilidade ou uma posição de confiança por estar a optar por um caminho inadequado. Para mim, dispensar uma pessoa é muito difícil. Gosto muito de ter a confiança do povo, de me rodear dos trabalhadores, das pessoas que são confiadas a mim. Sinto-me mal quando tenho que mandar embora alguém, mas às vezes é mesmo necessário fazer isso."


O regresso à infância de Francisco

Bergoglio também recuou à sua infância, lembrando que, em criança, gostava muito de dançar tango. Recordou também que o rei David, quando a Arca da Aliança regressou a Jerusalém, começou a dançar, mas a sua esposa Micol desprezou-o. "Esta senhora estava «doente de seriedade», aquilo a que chamo síndrome de Micol. As pessoas que não podem expressar alegria estão sempre sérias”.

O Papa confessou ainda que, em pequeno, queria ser talhante, porque quando foi ao mercado com a avó viu um açougueiro com um grande bolso no avental cheio de dinheiro, o que o fez pensar que estava perante um homem muito rico.

A Alessio, o Papa explicou que de vez em quando era acólito. Na altura, recorda, a missa não era celebrada em espanhol. "O padre falava, mas eu não entendia nada. A mesma coisa acontecia com os meus companheiros. Então, na brincadeira, imitávamos o padre alterando um pouco as palavras para fazer frases estranhas em espanhol. Divertíamo-nos assim. E gostávamos muito de ajudar na missa".

Francisco falou ainda do seu amor “pela bola”. "Joga-se bem futebol quando se joga em conjunto, em equipa, quando um jogador olha para o bem de todos, sem pensar em si próprio ou em dar-se a mostrar. É o que também deve acontecer na Igreja".

 

A família e a partilha

A família e as relações com outras pessoas foram outros dos temas das cartas trocadas entre Francisco e as crianças. "Todos nós discutimos, até eu discuto. É normal que as pessoas discutam”, afirma, respondendo a Alexandra, uma menina filipina que perguntou porque discutem os seus pais. “Assim, é normal que os pais também discutam. No entanto, os pais nunca devem terminar o dia sem fazer as pazes." Francisco ainda recomendou: "Se quiseres ajudar os teus pais, nunca fales mal de um deles com o outro. Fala sempre bem deles. Isso vai ser bom para todos."

A Mansi, que escreve da Índia, diz: "Podes encontrar Deus na tua família, querendo bem à tua mamã e ao teu papá. Se amares toda a tua família, então encontras Deus".

Já Thierry, da Austrália, perguntou por que é que Jesus não dá comida a todos. O Pontífice explicou que "o problema não é Jesus, mas as pessoas más e egoístas que querem manter tudo para si e não querem compartilhar. Devemos aprender a partilhar a riqueza que temos."


Acolher, sorrir, ajudar

Juan Pablo perguntou por que terá Jesus escolhido apenas algumas pessoas para serem apóstolos, e não outras. Bergoglio respondeu que "Jesus não escolheu em massa, mas cada um, um por um." “Todos nós somos eleitos pelo amor de Jesus, este amor que nos faz sentir escolhidos. Ele não exclui ninguém do seu coração."

Karla, da Nicarágua, questionou se até as pessoas más teriam um anjo da guarda. Francisco respondeu afirmativamente, dizendo que “todos nós temos”. Acrescentou ainda que "uma forma de ajudar essas pessoas é rezar ao nosso anjo da guarda, que as ajuda a tornarem-se boas."

Duas crianças holandesas perguntaram ao Papa o que gostaria de fazer sempre na sua vida. "Eu quero sempre sorrir, sorrir a Deus em primeiro lugar. Quero agradecer a Deus pela Sua paciência, pelo bem que faz e quero ajudar as pessoas que sofrem."

João, português

Entre as várias perguntas às quais Francisco respondeu,encontra-se uma de um pequeno português. “Querido papa Francisco, quando o vi na Praça de São Pedro senti uma grande alegria porque olhou para mim. O que sente quando olha para as crianças à sua volta? Obrigado pela sua atenção. Um abraço do João”. 

 


*[Tradução de Flávia Barbosa]

 



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