Arquidiocese de Braga -

por Eduardo Jorge Madureira Lopes

A comunicação digital conjuga-se com verbos peculiares: clicar, gostar, partilhar e viralizar, por exemplo. O clique é o que mais importa. Os títulos noticiosos são, por isso, cada vez mais, redigidos como apelos irresistíveis a uma visualização, para o que, frequentemente, replicam estratagemas que comprovadamente funcionam como eficazes chamarizes de atenção. Eis alguns exemplos:

“Adepto do Real Madrid protagoniza vídeo surpreendente que já é viral”.

Se é “viral”, é sempre para ver. Além de “viral”, é “surpreendente”. E, sim, também é sobre o futebol. A não perder, portanto. Mesmo que não se perceba por que é “viral”, correspondeu-se ao pretendido: corroborar a viralidade.

“Bombeiro coloca a vida em perigo para salvar esta cegonha. Saiba qual foi a recompensa”.

Quando nos instilam uma dúvida, não é fácil deixá-la por esclarecer. Qual terá sido, afinal, a recompensa?

“Câmara de filmar de restaurante surpreende casal a fazer o que não devia. Veja o vídeo”.

A indiscrição é um isco eficaz. Como há vídeos instalados em todo o lado, há que rentabilizar as imagens filmadas.

“Cão não sai do pátio do tribunal onde o dono se arrisca a alguns anos de cadeia. Saiba como reagiu quando o tentaram afastar do local”.

Qualquer pequena história com animais é promissora. Como resistir a mais uma?

“Confira a lista do Bastante Mais Futebol dos dez melhores futebolistas europeus de sempre”.

A generalidade das listas sobre os dez melhores de qualquer coisa não dispensa consulta, desde logo para conferir se coincide com a lista que cada um gostaria de apresentar.

“Conheça o bebé português que levou às lágrimas a primeira-dama do Turquemenistão”.

Feitos protagonizados por portugueses são imperdíveis. O bebé, e a sua simplicidade, que comove quem se presume ser imune ao sentimentalismo, merece ser descoberta.

“Criança cai de ravina e é salva por um faisão”.

O insólito chama habitualmente a atenção e a combinação de uma criança com uma ave ou com um animal é sempre um bónus não negligenciável.

“Discussão de aluna com professor de educação física torna-se viral”.

Todas as trapalhadas nas escolas têm vasta e segura audiência. Mas não se pode facilitar. Acrescente-se, pois, o rótulo de “viral”.

“Estudo científico comprova que todos podem cumprir facilmente a regra número um para evitar o cancro”.

As notícias que querem o bem da nossa saúde merecem consideração e clique.

“Internautas escolhem os 2000 melhores dos mais baratos restaurantes portugueses. Descubra o mais próximo de si”.

A gastronomia e a restauração são temas omnipresentes. Às vezes, pede-se o voto para multiplicar os cliques.

“Kim Kardashian leu um livro e relata a experiência”.

Kim Kardashian é sempre um assunto do momento, um permanente trending topic.

“Nu integral da protagonista de ‘Qualquer um cai’ provoca escândalo. Saiba porquê”.

Se há escândalo, há que ver. Como se não fosse suficiente o anúncio de nudez.

“O que elas julgam que os homens gostam de ouvir, mas estão enganadas” ou “O que eles julgam que as mulheres gostam de ouvir, mas estão enganados”.

A promessa de um abalo de uma convicção reclama que se verifique se a convicção é abalada.

“Padre acusa catequista e incendeia as redes sociais. Já há três manifestações marcadas”.

A curiosidade fica aguçada em relação a seja o que for que se diga que provocou um incêndio nas redes sociais. Um sarilho que se apresenta com um padre como protagonista tem clique garantido.

“Pobre devolve raspadinha premiada com 11 mil euros, mas é espancado pelo dono”.

A malvadez incomoda-nos. É preciso clicar para ver até onde pode ir tão ruim sentimento.

“Polémica. O que o ministro fez sem saber que estava a ser filmado”.

Se tem a palavra “polémica”, não é preciso reparar em mais nada. Clica-se de imediato.

“Ronaldo surpreende ginecologista com gesto enternecedor”.

Ronaldo é sempre clicável. E, por enquanto, as querelas entre Georgina (que alguma imprensa gosta de tratar por Gio) e Dolores Aveiro também rendem abundantes visualizações.

“Saiba qual é o documento comprometedor que a Maçonaria esconde” ou “Saiba qual é o documento comprometedor que o Opus Dei esconde”.

O anúncio de um segredo desvendado é irresistível. Mais um clique.

Estes títulos, assaz idênticos aos mais banais que todos os dias se encontram nas várias plataformas que difundem notícias, são sobretudo exemplos de pedidos de cliques. Pretendem-se tentadores, mas são unicamente extorsões de tempo.

FONTE: Diário do Minho, 19 de Novembro de 2017, p. 2.