Arquidiocese de Braga -

9 abril 2021

Observatório do Vaticano tem novo site

Fotografia Observatório do Vaticano

DACS com Crux

Irmão jesuíta Guy Consolmagno, director do Observatório, conversou com o Crux sobre ciência, fé e o espaço.

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Embora existam mais de 30 crateras na lua com o nome de cientistas jesuítas, até hoje ainda há quem não saiba que o Vaticano tem o seu próprio observatório, liderado por um jesuíta.

Para tentar divulgar o apoio da Igreja à ciência, o Observatório do Vaticano lançou um novo site, com podcast e loja incluídos.

Em Castel Gandolfo, o Irmão jesuíta Guy Consolmagno, director do Observatório do Vaticano, disse ao Crux que o Papa Leão XIII fundou a versão moderna do departamento em 1891 “para mostrar ao mundo que a Igreja apoia a Ciência.”

O Observatório, argumentou, “tem realizado um trabalho muito bom” quando se trata da parte científica, mas não tanto quando se trata de mostrar o trabalho que faz ao mundo.

O que se segue são partes da entrevista do Ir. Consolomagno ao Crux, conduzida por e-mail devido à diferença horária de nove horas entre Roma e Tucson, Arizona, onde está "preso" desde que a pandemia de COVID-19 começou.

 

Porquê lançar um site do Observatório do Vaticano, incluindo uma loja online e um podcast?

Sempre pensei que quando o Papa Leão XIII fundou a versão moderna do Observatório do Vaticano, em 1891, foi para “mostrar ao mundo que a Igreja apoia a ciência”. Realizámos um óptimo trabalho a fazer ciência; mas precisamos de fazer mais para o mostrar ao mundo.

Já tivemos sites anteriormente, mas atraíam pouca gente. Até que começámos um blogue com publicações diárias e funcionou melhor: recebíamos cerca de 400 visitas por dia. Sei que há tantas pessoas interessadas no que fazemos... precisávamos era de ajuda para descobrir como chegar até elas. O site inclui uma comunidade digital chamada Sacred Space Astronomy, e estamos a incentivar aqueles que desejam inscrever-se com uma modesta doação. A “loja” é, sobretudo, uma forma de agradecer a inscrição dessas pessoas, já que ao inscreverem-se recebem um cupão que podem usar na loja.

Os podcasts são não só outra forma de mostrar o nosso trabalho às pessoas, mas também de dar a conhecer com quem estamos a trabalhar e como nos divertimos a fazer esse trabalho. Estamos ligados a diferentes amigos e colegas do mundo da astronomia, como o astronauta aposentado Nichole Stott, e conversamos sobre o tipo de coisas que nos fascinam, como construir habitats na Lua!

 

Mencionou que está "preso em Tucson". Em que está a trabalhar? 

Normalmente venho a Tucson por dois ou três meses na Primavera, já que temos um telescópio fora da cidade. Aconteceu eu estar aqui quando a pandemia nos atingiu no ano passado. Os meus voos de regresso a Roma foram cancelados e, na altura, a Itália foi muito mais atingida do que os EUA, então fazia sentido ficar aqui. Acabou por ser uma grande oportunidade para trabalhar em coisas para a Fundação do Observatório.

Como deve saber, eu tenho duas funções: director do observatório e presidente da Fundação. O Observatório tende a ter mais a minha atenção. A astronomia é mais divertida do que angariar dinheiro! Mas, sem o apoio de benfeitores dos EUA e de outros lugares, não seríamos capazes de manter o nosso telescópio a funcionar.

Falar sobre astronomia é quase tão divertido para mim quanto estudá-la, então transformei o trabalho de divulgação pública da Fundação numa oportunidade para falar sobre astronomia. Isso torna este novo site no melhor de dois mundos. Posso falar sobre a astronomia que fazemos e atrair pessoas para o site onde, se quiserem, podem apoiar-nos.

Mas, na verdade, a minha ciência também não sofreu durante todo este tempo. Tenho um artigo científico recém publicado com um colega de há muito tempo e dois outros cientistas jesuítas sobre as propriedades do tipo de meteoritos que a missão “Osiris Rex” da NASA acabou de recolher do asteróide Bennu e é uma coisa empolgante... pelo menos para a dúzia de cientistas que se importam! Visto que vivemos em quatro estados diferentes (incluindo o Pe. Bob Macke, no Observatório em Roma), trabalhar de forma remota não era nenhuma novidade para nós e ter tempo disponível para trabalhar nisto foi uma bênção.

Ah, e eu escrevi um pequeno livro sobre espiritualidade e astronomia que será lançado em breve em Itália!

 

A exploração do espaço financiada pelo Estado e pela iniciativa privada continua a desenvolver-se rapidamente. Como vê o papel do Vaticano, particularmente do Observatório, nesta exploração? Está a trabalhar com Elon Musk ou o governo dos EUA na exploração ética do espaço? Há sequer alguma discussão actual sobre o que é ético quando se trata de explorar o espaço?

Escrevi um artigo sobre algumas das questões éticas da exploração espacial e dos recursos espaciais que saiu na Civiltà Cattolica no ano passado. É uma questão muito importante, mais do que algumas pessoas conseguem entender.

Mas o papel do Observatório não é o de “chatear” o resto da comunidade. Estamos tão entusiasmados como qualquer pessoa quando se trata de expor o sistema solar. Mencionei o Pe. Bob Macke, o nosso curador de meteoritos em Castel Gandolfo; é um cientista na missão Lucy da NASA aos asteróides de Tróia e irá medir algumas das amostras do asteróide Bennu. Ao mesmo tempo, também estamos muito cientes de como é fácil envolvermo-nos nos nossos próprios entusiasmos e perdermos de vista o contexto mais amplo.

Um papel importante que o Observatório tem conseguido desempenhar é o de servir como um terreno neutro onde as várias comunidades que têm interesse no espaço podem reunir-se. Em 2018, recebemos um workshop que reuniu cientistas de asteróides, industriais do espaço, académicos e embaixadores sob a coordenação do Gabinete de Assuntos Espaciais das Nações Unidas. Isto aconteceu como preparação para um encontro naquele Verão sobre os usos pacíficos do espaço, realizado pela ONU em Viena, onde representei a Santa Sé.

 

Como descreveria o seu trabalho aos que, como eu, não sabem nada sobre o céu? Como é que o seu trabalho se relaciona com a sua fé católica?

A minha fé diz-me que Deus criou o universo... um universo que é lógico, bonito e bom. A minha ciência consiste em tentar descobrir como é que Ele o fez! Em particular, estudo meteoritos – rochas do espaço sideral – que datam da origem do sistema solar e nos dão pistas sobre o que aconteceu nessa altura, há cerca de 4,6 bilhões de anos.

 

Sabemos que em criança se interessava por ficção científica. Mantém o mesmo interesse? Algum livro, filme ou programa que recomende? Algum que, por exemplo, discuta ciência, espaço e fé?

Eu adoro ficção científica! Lembra-me que os planetas são lugares onde as pessoas vivem aventuras. Dito isto, embora existam muitos trabalhos literários profundos neste campo, confesso que também gosto de pura "ópera espacial"... Sim, também sou um grande fã de Star Wars!

Todos os Domingos, quando estou em Tucson (e agora que fomos vacinados), eu e os meus amigos Nancy e Larry Lebofsky, que conheço desde os meus dias de escola, reunimo-nos para assistir a filmes de ficção científica antigos e rir com os monstros de borracha. Mas também adoro livros (e filmes ocasionais) que evocam uma "sensação de maravilha". Para citar três: “The Book of the Long Sun” de Gene Wolfe; “Dune”, de Frank Herbert; e “Cordelia’s Honor”, de Lois McMaster Bujold. Uma vez escrevi um artigo científico baseado numa interpretação que tive de um romance de Hal Clement, “Iceworld”.

 

É frequentemente apontado como "o observador das estrelas do Vaticano". É uma descrição precisa?

Claro. Não sou o único observador de estrelas do Vaticano; há uma dúzia de cientistas no Observatório do Vaticano. Mas realmente estou no Vaticano e, no final do dia, quando estou cansado de olhar para os dados no ecrã do computador, adoro ir lá para fora observar as estrelas.

 

Artigo de Inés San Martín, publicado no Crux a 9 de Abril de 2021.