Arquidiocese de Braga -

14 março 2022

Ucrânia, “guerra justa” e legítima defesa

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DACS com La Croix International

O Papa condena veementemente o conceito de “guerra justa” na “Fratelli tutti”. Então isso significa que não podemos apoiar a Ucrânia em relação ao ataque agressivo da Rússia?

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É difícil contentarmo-nos em “rezar pela paz”, enquanto se espera que as armas se calem. Ou tratar todas as partes como iguais em todas as situações de conflito que surgem.

O que está a acontecer na Ucrânia obriga os cristãos a esclarecer sua visão ética dos conflitos armados, especialmente porque ambos os lados afirmam pertencer à mesma denominação cristã, a Ortodoxia.

Quando publicou sua encíclica Fratelli tutti, o Papa Francisco quis condenar definitivamente a expressão “guerra justa”, que permitiu à Igreja legitimar um certo número de combates armados desde... São Tomás de Aquino, o grande teólogo que reflectiu sobre este conceito.

De facto, adicionar o adjetivo “justo” ao substantivo “guerra” como algo positivo representa um problema. E, historicamente, essa noção de “guerra justa” tem sido usada para justificar muitas cruzadas ou guerras de conquista.

Mas, seja o que for, a guerra é um mal. Durante um século, especialmente com o Vaticano II, a doutrina católica tentou limitar os casos em que os conflitos pudessem ser considerados legítimos.

Mas nunca existem situações em que o uso de armas possa ser justificado? Podemos simplesmente deitar a teoria da “guerra justa” no balde do lixo da história? Isso não seria ingénuo?

Ao longo dos séculos, a tradição ética desenvolveu toda uma série de critérios para justificar a acção militar.

“Hoje é muito difícil sustentar os critérios racionais amadurecidos noutros séculos para falar de uma possível «guerra justa»”, escreve o Papa na Fratelli tutti.

É difícil, sim. Mas não impossível... Especialmente num mundo onde a violência não desapareceu.

Diante de Putin, seria absurdo explicar aos ucranianos que não se deveriam defender militarmente. Há casos em que a “autodefesa”, uma noção importante do direito internacional, é necessária.

É claro que, num conflito, nem sempre é claro quem iniciou a guerra. No caso da Ucrânia, no entanto, é bastante óbvio.

O agressor é a Rússia de Putin, e não nos devemos deixar enganar por um discurso paranóico que nos faz pensar o contrário – ainda que a história e uma série de humilhações sucessivas possam explicar em parte o que vivemos hoje.

Podem explicar, mas não justificar...

É verdade que o Evangelho se esforça por banir a violência. Todos conhecemos o famoso ditado: “Se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a outra” (Mateus, 5-39).

Mas o Evangelho exige que permaneçamos passivos diante da agressão do outro? Por exemplo, se o Bom Samaritano tivesse chegado alguns minutos antes ao local do ataque, teria deixado os bandidos baterem no homem que resgatou? Não interviria?

Desarmar o agressor é um requisito ético. Seria ingénuo negar que isso às vezes requer meios militares. Seria também uma falta de caridade.

Pois enquanto o imperativo da não-violência percorre todo o Evangelho, a obrigação da caridade continua a ser a mais importante: a não assistência a uma pessoa em perigo – alguém que está a ser agredido e cuja vida está ameaçada – também devem ser levados em consideração.

Em termos concretos, há situações em que não podemos “absolutizar” o recurso à não-violência. Enquanto o mal existir, haverá sempre casos em que a resistência militar é necessária.

A paz é uma luta que às vezes precisa de armas.

Artigo de Isabelle de Gaulmyn, publicado no La Croix International a 12 de Março de 2022.