Arquidiocese de Braga -

20 outubro 2022

Em direção ao bem comum. Família e habitação em primeiro lugar

Fotografia DR

DACS com Omnes

É necessário modificar o sistema económico e orientá-lo para o bem comum, como pede o Papa. É urgente proteger a família, abordar uma política pública de habitação e fortalecer o sistema de garantia de rendimento mínimo.

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Antes da crise da Covid-19 chegar, se retrocedermos dois anos, a realidade da nossa sociedade (não só espanhola, europeia, global) continuava a ser uma realidade de desigualdade, não de falta de bens, mas de distribuição indevida desses bens. E se a vincularmos à Doutrina Social da Igreja, não avançamos positivamente nem na destinação universal dos bens, nem numa sociedade orientada para o bem comum.

Estamos perante uma forma de desenvolvimento económico e social em que, quando chega uma crise, aumenta a pobreza e a exclusão social; mas quando saímos da crise, não voltamos aos níveis pré-crise. Ou seja, estamos a acumular, na maioria da população, dificuldades de pobreza e exclusão social.

Desta análise, extrairia três elementos: emprego, habitação e saúde. É verdade que muita capacidade de emprego foi recuperada, e isso é uma ótima notícia. Mas também é verdade que o emprego tem cada vez menos capacidade para proteger as famílias e integrá-las socialmente. Ou seja, em mais de metade das famílias que acompanhamos na Cáritas alguém trabalha. Apesar do trabalho, são muitas as famílias que têm de continuar a vir à Cáritas. Nem com dois pequenos trabalhos é suficiente.

 

A questão da habitação

E por que enão é suficiente? Por muitos factores, mas principalmente pela habitação. Passamos muitos anos sem resolver a questão da habitação. As famílias têm que gastar muitos recursos para poder pagar pela habitação e suprimentos. Isto significa que quando há um rendimento fraco, por empregos pequenos ou instáveis, obviamente não chega. E mesmo conseguindo melhores condições de trabalho, também não é suficiente, porque a habitação cada vez mais do nosso dinheiro.

Em terceiro lugar, a saúde. A inacessibilidade das famílias aos tratamentos adequados de saúde mental.

Como é que estas questões podem ser abordadas? Começo com uma alteração profunda. Precisamos de dar um passo decisivo em direção a uma nova economia, que em vez de estar ao serviço de indivíduos específicos, ou interesses particulares, está ao serviço do bem comum. Isso sem questionar, obviamente, o espaço legítimo da economia e, de alguma forma, da iniciativa.

E aqui podemos olhar para os números 154 e 155 da encíclica Fratelli tutti. O Papa Francisco diz-nos: “Para se tornar possível o desenvolvimento duma comunidade mundial capaz de realizar a fraternidade a partir de povos e nações que vivam a amizade social, é necessária a política melhor, a política colocada ao serviço do verdadeiro bem comum. Mas hoje, infelizmente, muitas vezes a política assume formas que dificultam o caminho para um mundo diferente”.

 

Três elementos

Precisamos de ser capazes de modificar o sistema económico em que estamos assentes, reorientá-lo para esse bem comum e partir das necessidades dos últimos, dos mais frágeis. E aí temos que superar uma visão baseada nas formas liberais  – diz a Fratelli tutti –, ao serviço dos interesses económicos dos poderosos.

Destaco também três elementos. O primeiro é aumentar e redirecionar o investimento na proteção da família. Passamos muitos anos, no caso específico do Estado espanhol, sem atender à família. As famílias numerosas são as que mais sofrem os efeitos desta crise, como as da anterior. Temos que ser capazes, de uma vez por todas, de geral uma proteção universal para as crianças.

Dotamo-nos de mecanismos para proteger os nossos mais velhos, e temos que nos dotar de mecanismos para proteger as famílias que criam os filhos, que, no fundo, são o alicerce, a pedra sobre a qual construímos nossa sociedade.

Em segundo lugar, precisamos de resolver a questão da habitação de uma vez por todas. E embora não seja fácil, temos que dar um primeiro passo: gerar um parque habitacional público para alugar, que ajude as pessoas com menos recursos a terem um espaço mínimo de segurança, que é a casa, a moradia, o ambiente mais necessário.

Por último, mas não menos importante, temos que enfrentar a necessidade de que essa cobertura de rendimento mínimo seja real e alcance todas as famílias que mais precisam.

São três elementos: proteção à família, abordagem pública da política habitacional e reforço do sistema de garantia de rendimento mínimo.

Artigo de Raúl Flores, publicado em Omnes a 18 de outubro de 2022.