Arquidiocese de Braga -

23 fevereiro 2023

Uma viagem a Ocua

Fotografia Paulo Gavriel Souto/DACS

Renata Rodrigues/DACS

Quando falamos em Ocua, diocese de Pemba, em Moçambique, o que nos vem à memória? Se a resposta é ‘a nossa missão, a nossa paróquia em África’, está certo! Para fazer uma viagem até lá, sem precisar de sair de Braga, convidamos todos a visitar a exposição

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[Igreja Viva] Como surgiu a ideia de fazer a exposição?

[Sara Poças] Há muito tempo que já estávamos a querer divulgar este projeto, que tem oito anos de existência. Como podem ver à volta, temos um espólio enorme de fotografias e de vivências que queríamos partilhar. O Museu Pio XII desafiou-nos a fazer esta esta exposição e decidimos fazê-lo em forma de viagem.
Convidamos as pessoas a fazer uma viagem até Ocua. Começamos com uma saudação: “Salama! Salama!” É a saudação macua, para quando as pessoas chegam. A primeira palavra que as pessoas aprendem. Mais que um olá, é um olá, tudo bem? Como é que estás? É um cumprimento de acolhimento.

[Igreja Viva] Estamos no 5º andar, e faremos a viagem partir daqui, certo?

[Sara Poças] Neste piso chegamos à paróquia da Ocua. A cada um dos pisos da Torre associamos um título e uma encíclica. Aqui estamos na ‘Terra vermelha-vida’ e associamos a “Alegria do Evangelho”, porque no fundo, acreditamos que esta alegria que nos traz a missão é a principal aprendizagem que tiramos deste projeto.
Aqui podemos ver um bocadinho da missão, desde as estruturas, as capelas, a Igreja, o terreno, toda a alegria das celebrações, essa vida, dos sacramentos (batismos, confissão, casamentos). Também temos os projectos da Pastoral da Mulher e da Pastoral Social que respondem às necessidades que foram sendo identificadas ao longo do tempo de permanência das equipas missionárias que também estão aqui representadas.

[Igreja Viva] Qual é a associação temática que fizeram?

[Sara Poças] No fundo, a esta alegria do anúncio do Evangelho, ou seja, da Diocese de Braga se abrir a uma outra missão, extraterritorial, nesta perspetiva de sair e ir ao encontro do irmão e também da aprendizagem, do que podemos dar, mas também do que podemos receber e aprender na missão, com tudo que isso implica.

[Igreja Viva] A exposição é uma oportunidade das pessoas conhecerem mais a missão?

[Sara Poças] Provavelmente muitas pessoas já ouviram falar que há uma paróquia extraterritorial, em Moçambique. Porém, acho que só conhece verdadeiramente o projeto quem tem alguma ligação, ou por algum missionário. Este conhecimento é muito emocional. Por isso também dizemos, desde o início, que esta é a Paróquia 552 da Arquidiocese de Braga, para que as pessoas realmente tenham esta apropriação afetiva e considerarem esta paróquia como nossa.

[Igreja Viva] É uma realidade muito dura que a comunidade e os missionários lá enfrentam?

[Sara Poças] O terceiro piso, que se chama Terra vermelha- sangue, fala da realidade da guerra de Cabo Delgado. Obviamente, antes de haver guerra, a província de Cabo Delgado já era uma das províncias com um dos maiores índices de pobreza dentro de Moçambique.
Portanto, isso, traz uma série de problemas sociais que chegam à missão, como por exemplo, as questões de saúde, as questões de desnutrição, as questões de baixa escolarização e analfabetismo, principalmente nas raparigas. Fomos tentando ao longo do tempo ir ao encontro desses desafios, como por exemplo, através da ativação do posto de saúde. Depois também percebemos que havia a questão da desnutrição nos bebés, que era muito grave e que vem da desnutrição das próprias mamãs.
Depois trabalhar na parte da escola, principalmente das raparigas, porque percebemos que há um grande a uma grande taxa de analfabetismo e de pouca permanência das crianças na escola. Mas se ela é grande, no geral, nas raparigas é muito maior. Incentivamos que as raparigas estudem e pagamos as propinas e o uniforme a partir do ensino secundário, para incentivar as meninas a estudar.
Temos um terreno agrícola enorme na paróquia que temos utilizado, no fundo, para que as pessoas possam colher e ter a sua sustentabilidade alimentar. É uma espécie de cooperativa. A pessoas contribuem com parte da colheita para a missão, para que depois também isso possa contribuir para a sustentabilidade da paróquia e da missão.

[Igreja Viva] A continuar a viagem…

[Sara Poças] No quarto piso temos a ‘Terra vermelha-cor’ que está associada à encíclica “Laudato Si” e que nos fala um pouco das cores da natureza, da terra, do pôr-do-sol, da água, das árvores frondosas, coisas que encantam as pessoas quando chegam a este contexto, porque na verdade são coisas muito diferentes das que estamos habituados. Então é sem dúvida um encanto. Os embondeiros, aquelas árvores frondosas que se encontram na missão e que ninguém passa indiferente aquele pôr do sol e aquela paisagem.
Depois passarmos para o terceiro piso que é ‘Terra vermelha-sangue’ e que nos fala deste conflito de Cabo Delgado que acontece desde 2017 e que temos acompanhado porque estamos na missão desde 2016. Embora não tenha atingido de uma forma muito intensa o território da missão (estamos a falar de uma província que é mais ou menos do tamanho de Portugal), obviamente que isso afeta todo o país.
A nossa paróquia acolhe também deslocados dos conflitos. Temos dois campos de reassentamento. São campos cedidos pelo Governo para que as pessoas reconstruam as suas vidas, que tenham um terreno agrícola também para cultivar, para garantir a sua soberania alimentar.
Esse piso conta um bocadinho a história da guerra. Dom Luiz Lisboa, o antigo bispo de Pemba (passionista, brasileiro), lutou para denunciar esse conflito, e isso quase que lhe valia a vida.
Depois passamos para o piso de baixo, que nós chamamos ‘Terra Vermelha-festa’ em que associamos à exortação apostólica “Cristo Vive”, porque no fundo, mostra a alegria da festa e a alegria desta comunidade jovem, desta Igreja jovem que celebra.
Aí falamos muito das crianças e sua alegria, as tradições, da comida, dos tecidos, das capulanas e para o que servem.
No primeiro piso, temos a ‘Terra vermelha - alegria’, associada à exortação apostólica “Gaudete et exsultate”, que nos fala de testemunhos de pessoas que fazem parte da missão, quer os voluntários, quer pessoas que são pessoas marcantes na comunidade, impactantes, por vários motivos, que já passaram na missão.
Além disso, ao longo de toda a exposição temos várias questões que fomos colocando às pessoas que passaram pela missão. Temos esses testemunhos espalhados por toda a exposição.
No fundo, queremos que esta exposição, para além das fotografias, tenha um pouco da voz das pessoas que foram passando na missão e também temos espalhado pela missão artigos de opinião, que foram saindo no Igreja Viva, principalmente, de saber sobre coisas que as pessoas foram escrevendo, sobre a missão, sobre histórias, sobre perceções.

[Igreja Viva] Chegamos ao piso por onde entram os visitantes!

[Sara Poças] São as boas-vindas. O Salama!, que é a saudação a todas as pessoas que vêm visitar a missão. Localizamos o Centro missionário, o projeto, a história do projeto, como é que ele nasceu, de onde é que ele vem. E, entretanto, também agora, em dezembro de 2022, tivemos a visita à missão de Ocua, do nosso Arcebispo, D. José Cordeiro, e quisemos dedicar uma parte da exposição à visita que que ele fez. Também são as boas-vindas do nosso arcebispo a essa missão.

[Igreja Viva] Pode-se visitar até quando?

[Sara Poças] A exposição foi montada no Advento. Mas como é normal que com o contributo penitencial da Arquidiocese de Braga, seja para uma parte destinada à missão do Ocua e à Diocese de Pemba, conjuntamente com o Museu, decidimos estender esta exposição até à Páscoa.
Fizemos uma atualização de algumas coisas dessa exposição. Tínhamos um presépio no rés-do-chão na altura do Advento e agora atualizarmos para alguns objetos mais quaresmais com símbolos que nos levam mais a esta reflexão.

[Igreja Viva] E para onde segue a viagem depois?

[Sara Poças] Gostávamos que depois da Páscoa, aproveitando também todo este material que recolhemos, circulasse por outros outros locais. A exposição pode ser acolhida em alguns arciprestados ou escolas. Também porque temos trabalhado com a educação moral religiosa católica, no envolvimento no projeto.
É um convite para que alguma instituição ou organização possa acolher a exposição.
Quem gostasse de acolher esta visita pode contactar-nos.

Entrevista publicada no Suplemento Igreja Viva de 23 de fevereiro de 2023.


Download de Ficheiros

igreja viva 23 de fevereiro de 2023.pdf