Arquidiocese de Braga -

9 junho 2023

“A única coisa que fiz foi dizer sim a uma graça que é de Deus”

Fotografia DR

DACS

Fomos conversar com o padre Jorge Oliveira sobre a vocação amadurecida, que veio depois de uma carreira já bem sucedida, e que o levou para fora do país. Padre Jorge fez o Seminário Internacional do Opus Dei, em Roma.

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Engenheiro, corredor de maratonas, doutorando em Teologia Moral (Ética Económica) e o  mais recente bracarense a ser ordenado sacerdote. Padre Jorge Oliveira, Opus Dei, ordenado em Roma no dia 20 de maio deste ano, está em Braga para celebrar a Missa Nova (a primeira missa na cidade) em meio a familiares e amigos, na “casa” da Senhora do Sameiro, devoção que lhe acompanha desde sempre. A missa será neste sábado, 10 de junho, às 15h.

Fomos conversar com o sacerdote sobre a vocação amadurecida, que veio depois de uma carreira já bem sucedida, e que o levou para fora do país. Padre Jorge fez o Seminário Internacional do Opus Dei, em Roma. Em sua oferta de vida, o próximo passo é um estágio em Sevilha (Espanha), para depois regressar a Portugal.

Antes de irmos ao engenheiro que se tornou padre, por que a Opus Dei?

A Opus Dei é também uma vocação dentro da Igreja. E foi isso que descobri quando tinha 18 anos e vivia aqui em Braga. Entre muitas outras espiritualidades, fez-me sentido o Opus Dei porque a mensagem era a de procurar a santidade no meio do mundo. Pensei mesmo que Deus me chamou para isso. Aderi e confirmei que era de facto o meu caminho de felicidade. Há mais de 20 anos que estou na Opus Dei e sou feliz.

Morou em Braga até os 18 anos. Daqui foi para onde?

Fui para Lisboa estudar Engenharia no Instituto Superior Técnico. Quando concluí, trabalhei em várias empresas e voltei para a universidade para fazer o mestrado, na altura, e para dar aulas de gestão da Construção, uma área muito específica, que gostava muito, e depois também trabalhar no setor da banca.

Falou sobre o chamado da Opus Dei para estar no mundo. Era de uma área de exatas, que lida, no geral, menos com pessoas. Como foi essa trajetória da engenharia para o sacerdócio?

Há um ponto comum. De facto, é uma área que está muito longe daquilo que podemos chamar de antropologia cristã. Todos estes cursos são mais científicos e mais técnicos. Mas para mim, por exemplo, quando faço o cálculo de pilares, de uma ponte, ter que calcular isso e depois olhar para eles de maneira crítica, obrigou-me e ajuda-me a ter também um olhar crítico sobre as minhas convicções, aquilo em que acredito.

A fé não é só uma coisa que me é dada exteriormente, é uma adesão interior, uma adesão crítica. E, portanto, é muito bom que façamos as perguntas e as perguntas últimas sobre Deus. O Papa Francisco e o Papa Bento XVI, nos últimos anos, nos levaram a isso. E parte dessas respostas conseguimos dá-las também com Deus.

Quando se deu o “click”, do engenheiro para o sacerdote, para o seminário?

Mais que um “click”, é todo um processo, porque é uma mudança de vida grande. Estava a trabalhar num banco em Lisboa quando o Bento XVI veio a Portugal, em 2010. Ele fez uma homilia no dia 14 de maio, na Avenida dos Aliados, no Porto. É um dia dedicado a São Matias, que  substituiu Judas no Colégio Apostólico.

Uma das coisas que o Papa disse era ser importante nos convertermos em testemunhas de Cristo. E nesse momento pensei - se o Papa diz que temos que nos converter, quer dizer que o próprio Papa também tem que se converter. Não era só uma questão para mim ou as pessoas que ali estavam, na Praça dos Aliados, chamados a essa conversão.

Aquelas palavras tocaram-me muito, ao ponto de pensar, no meio da minha oração, na minha relação com Deus, na minha direção espiritual, que, talvez, Deus me quisesse chamar ao sacerdócio. Portanto, aquilo que fiz foi fazer uma pausa na minha carreira, digamos, profissional e durante uns tempos perceber se o sacerdócio era para mim.

Foram anos de preparação para uma coisa muito séria, muito decidida, muito querida e que se concretizou há poucos dias, no dia 20 de Maio.

Há quem diga que para uma pessoa um pouco mais velha, já com uma carreira, seria uma vocação tardia. Mas podemos falar de uma vocação amadurecida?

Penso que sim, mas repare, ajuda-me a pensar, ao abrir a Bíblia, olhar para os Evangelhos, perceber que Jesus escolheu discípulos com condições e idades muito diferentes. Escolhe São João muito jovem, escolhe São Mateus mais velho, Santo André, São Pedro e todos eles são válidos para a missão. Honestamente penso que Deus me chamou quando tinha que chamar.

Acredito mesmo que Deus tem tudo a ver com a minha vocação, com o meu sacerdócio, com o meu futuro. Se me quis chamar nesta altura terá as suas razões. Espero um dia conseguir percebê-las. Mas aquilo que posso testemunhar é que estou a ser muito feliz com este passo que dei.

Como foi a ordenação?

Foi comovente, as pessoas cumprimentam, dão os parabéns. O que sinto é que estou a receber uma graça muito grande e que Deus parece que me escolhe como um predileto seu, para que seja um instrumento no meio do mundo, para a confissão, para celebrar a Missa e para celebrar os sacramentos, para celebrar a Sua presença.

Por isso, honestamente, até me faz um bocado confusão a maneira como as pessoas se alegram, dão-me os parabéns, porque eu não fiz nada. A única coisa que fiz foi aceder ou dizer que sim a uma graça, mas uma graça que é totalmente de Deus.

Fez o percurso todo longe. Isso foi bom ou fez falta o ambiente mais familiar?

São Paulo diz que para nós é o mundo, ou seja, o mundo é tudo nosso e o mundo foi-nos dado em herança. Honestamente nunca senti-me em Roma como um estrangeiro, ou quando estudava, ou até falando com pessoas de outras nacionalidades. Isso foi um grande enriquecimento e um grande desafio. Emociona-me, logicamente, voltar a Braga, a minha cidade, e aqui estou para celebrar a minha primeira missa na cidade.

Escolheu o Sameiro por algum motivo especial? 

O Sameiro é sempre a casa de Nossa Senhora. Às vezes penso que escolhi-o por duas razões. A primeira, porque tenho uma grande devoção a Nossa Senhora. Ela é mãe dos sacerdotes, dos confessores e tenho-na de maneira especial na minha devoção, acho que todos os cristãos devem ter. Para mim, em específico, Nossa Senhora do Sameiro. Tenho uma imagem dela no meu quarto, que me acompanha em tudo, em todas as cidades, em todos os momentos que vivi até agora. Também vai acompanhar-me em tudo no sacerdócio. 

A segunda razão, como sou de Braga, é que os meus pais queriam muito que fosse lá. Foi aqui juntar uma opção muito pessoal e também opção familiar e estou muito contente com isso.

Como vê a sua missão sacerdotal e ao que Deus lhe chama nesse tempo da Igreja?

Hoje vejo dois grandes desafios. Um deles é entre amigos que tenho da universidade, casais jovens… Fortalecer a fé destas pessoas. Deus, afinal, é muito maior do que imaginamos. Deus não é um polícia de trânsito que anda atrás de nós para que cumpramos certas regras que são exteriores e que nos chateiam.

Deus é Pai. E reafirmar, sublinhar essa verdade, é um grande desafio que tenho. Quero ajudar as pessoas a reencontrarem-se com Deus. 

O segundo é ser instrumento dos sacramentos de Deus, em especial da confissão. Porque é uma coisa que ajuda-me muito, em primeiro lugar, porque também me confesso. Portanto sei que é um sacramento da alegria, como diz o Papa Francisco, e quero ser instrumento dessa alegria. 

E a Missa. Isto é, fazer com que as pessoas tenham acesso a Deus nesse momento privilegiado, em que Jesus quis estar connosco.

No site da Opus Dei deram destaque ao seu amor pelo desporto, pelas maratonas. No que isso lhe ajuda?

O desporto para mim é muito importante, porque é uma metáfora da vida. Todas as coisas grandes da nossa vida exigem esforço. Tudo aquilo que vale a pena envolve um sacrifício. Além de gostar de correr, sempre tive essa paixão, pelo menos nos últimos dez anos, passei a fazer provas oficiais. Fiz dezenas de meias maratonas, fiz quatro maratonas, a Maratona de Roma agora em 19 de março e tenho uma equipa de atletismo. Isso ajuda-me muito a perceber aquela máxima que tinham os gregos, "alma sã em corpo são". Portanto, se a minha alma sacerdotal tem que ser grande, de serviço, de entrega aos outros, então essa alma também tem que estar num corpo são.

Penso muito na união entre estes dois mundos. Além disso, São Paulo também é muito claro. Ele diz que temos que correr pelas coisas que valem a pena. Logicamente que corro por uma questão desportiva e física, mas a minha corrida, minha maratona mais importante, é o sacerdócio. É essa que quero agarrar com tudo, com toda a força. É essa que quero terminar como um grande serviço a Deus e à sociedade.