Arquidiocese de Braga -

19 outubro 2021

Arcebispo diz que a Assembleia da América Latina é sinodal, mas não é um sínodo

Fotografia DR

DACS com Crux

Ex-bispo auxiliar do então cardeal Jorge Bergoglio – agora mais conhecido como Papa Francisco – em Buenos Aires é o Secretário Geral da Conferência dos Bispos da América Latina e do Caribe (CELAM).

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O arcebispo Jorge Lozano, de San Juan, Argentina, não parece uma das pessoas mais influentes na Igreja Católica: a sua cruz peitoral é de madeira, feita à mão por um recluso. A “corrente” é de juta em vez de um metal precioso.

No entanto, o ex-bispo auxiliar do então cardeal Jorge Bergoglio – agora mais conhecido como Papa Francisco – em Buenos Aires é o Secretário Geral da Conferência dos Bispos da América Latina e do Caribe (CELAM).

Também é um dos organizadores da próxima Assembleia Eclesial que acontecerá na Cidade do México em Novembro, com a participação de 200 bispos, 200 sacerdotes e diáconos, 200 religiosos e religiosas e 400 leigos.

O objectivo do processo é preparar a Igreja Latino-Americana para dois grandes aniversários: em 2031, o 500º aniversário da aparição de Nossa Senhora de Guadalupe e, em 2033, o 2.000º aniversário da morte e ressurreição de Cristo.

Actualmente em Roma, também participou na abertura da consulta sinodal no fim-de-semana passado, antes do Sínodo dos Bispos de 2023. Lozano conversou com o Crux sobre as diferenças entre a assembleia Latino-Americana e o Sínodo, bem como o que espera de ambos os processos.

 

Como viveu o primeiro dia do Sínodo?

Com intensidade. Já estamos com a presidência do CELAM há vários dias, então, no meu esquema das coisas, não foi o primeiro dia, porque todas as outras visitas que fizemos estavam relacionadas com o processo sinodal. E culminamos com um encontro com o Papa. O cardeal Leopoldo Brenes [de Manágua, Nicarágua] não pôde estar presente porque acabou de ter COVID-19 e está a recuperar. Foi uma audiência muito boa.

 

Porquê?

É a primeira vez que estou com o Papa desde que me tornei secretário do CELAM, e passámos-lhe os relatórios dos processos que o CELAM está a atravessar, com um caminho de renovação e reestruturação que tem a ver com uma questão organizacional, mas também com a nossa adaptação a este momento particular da vida da Igreja. Também lhe demos uma versão dos novos estatutos, que também apresentámos à Santa Sé, que ainda pode ser modificada, e também lhe entregámos uma publicação que fizemos para uso interno com o resultado da primeira escuta, o processo que fizemos de Março até ao fim de Agosto. É material em estado puro, que não foi analisado, nem discernido, nem organizado, mas é o que as pessoas disseram.

 

Quantas pessoas falaram?

Entre 65.000 e 70.000 pessoas, em espaços diferentes, alguns também individualmente, porque havia uma alternativa na plataforma. E depois foram cerca de 15.000 pessoas a fazê-lo em cerca de 50 fóruns temáticos, que trataram de tudo, desde o quotidiano da vida da Igreja até questões sociais e ambientais.

 

Olhando para Novembro, altura do encontro na Cidade do México, como se estão a preparar?

Nestas semanas estamos a analisar esse material, pois estamos a preparar o que se chama de “documento de discernimento”, que é a recolha dos contributos das pessoas, para preparar até ao final de Outubro um texto com algumas perguntas para podermos entregar aos pouco mais de 100 membros da assembleia, para trabalharmos nele de 21 a 28 de Novembro.

 

Qual é a importância da Assembleia Eclesial?

Até agora, na tradição da América Latina, desde o início da evangelização, tivemos muitos sínodos e conselhos provinciais. Mais recentemente, desde a década de 1950, realizaram-se cinco conferências gerais do episcopado, reunindo representantes dos bispos de cada país a cada 10 ou 12 anos e fazendo um discernimento sobre a situação da realidade. A última foi em Aparecida, em 2007. Numa assembleia dos presidentes e vice-presidentes de cada uma das 22 conferências que compõem o CELAM em 2019, houve um mandato para a nova presidência pedir ao Papa a possibilidade de convocar uma sexta conferência geral. Quando em Setembro daquele ano foi feito o pedido, ele disse que não, que ainda há muito a recuperar de Aparecida.

Ele recomendou que organizássemos um encontro de todo o povo de Deus: para aprofundar, avaliar, ver o que foi feito e o que ainda está pendente. Deu-nos liberdade sobre o formato, mas insistiu que não deveria ser apenas de bispos. E decidimos pelo formato da assembleia, porque uma reunião, embora muito positiva, em geral começa e termina, mas não desenvolve processos. Também não queríamos algo académico, com conferências sobre Aparecida. Então, apresentamos esta ideia ao Papa, ele aprovou-a, em Novembro de 2020 discutimos a metodologia e o Papa iniciou este processo a 24 de Janeiro, convocando esta assembleia eclesial que tem várias fases.

A primeira fase foi de escuta, a fase actual é de escuta. Em novembro, haverá 1000 delegados do continente, incluindo membros da assembleia das comunidades latinas dos Estados Unidos e Canadá. A assembleia apresentará algumas propostas sobre os desafios pastorais. Com o CELAM vamos discernir essas propostas, para termos opções pastorais que nos acompanharão até 2031, em que se comemora o 500º aniversário das aparições da Virgem de Guadalupe a San Diego, e 2033, quando será celebrado o 2000º aniversário da Redenção.

 

O que diria às pessoas que pensam que a sua voz não conta – nem no sínodo nem na assembleia – porque estão desiludidas?

Eu faria mais do que dizer, porque quem está desiludido não se motiva com palavras, mas com acções. Se a assembleia conseguir reunir as contribuições do povo de Deus... São mil membros da assembleia, não 40 pessoas. E esses mil prestarão contas do andamento da assembleia, e poderão dar testemunho sobre terem sido ouvidos e sentirem-se representados nas reuniões.

Quando vejo situações de cepticismo, eu entendo, porque faz parte do caminho da vida, e quando tens feridas, não te queres magoar de novo e é difícil confiar novamente. A solução é fazer a coisa correcta, ao invés de falar.

 

Quem são esses mil membros da assembleia?

Serão 200 bispos, 200 sacerdotes e diáconos, 200 religiosos e religiosas e 400 leigos. Entre os leigos, de diferentes idades e dedicações, quisemos incluir também as vozes que nem sempre são reconhecidas, como as dos presos, dos que estão em comunidades de recuperação de dependências, dos que trabalham com pessoas em situação de rua, em trabalho pastoral afro-americano. Queremos recolher as opiniões daqueles que fazem parte da estrutura orgânica habitual da vida da Igreja, mas também dessas pessoas que são baptizadas e que respondem ao apelo do Papa para centrarmos a nossa atenção nas periferias, geográficas e existenciais.

 

Como entende ou diferencia o processo da Assembleia Latino-americana e do Sínodo da Igreja universal?

A Assembleia Eclesial não é um Sínodo latino-americano e o Sínodo universal não é uma assembleia. O Sínodo é de bispos e quer analisar uma questão relacionada com a Igreja universal a respeito de uma Igreja sinodal em comunhão, participação e missão, com uma enorme riqueza e potencial. Mas não está a procurar definir o caminho para a Igreja na preparação de 2031.

 

Canonicamente, a Assembleia é uma novidade?

Sim, significa que nas dioceses, ou, neste caso, a nível continental, procuramos definir alguns desafios e respostas pastorais para a nossa própria realidade eclesial. É um exercício concreto de sinodalidade, por isso é tão importante entendermos os dois processos como simultâneos, parte do mesmo espírito sinodal, mas de natureza diferente. Essa simultaneidade também acontece na vida.

 

Artigo de Inés San Martín, publicado no Crux a 15 de Outubro de 2021.