Arquidiocese de Braga -

18 novembro 2021

Arcebispo pede rosto “terno” da Igreja que é verdadeiramente pró-vida

Fotografia CNS/Bob Roller

DACS

Misericórdia e diálogo, em vez de duelos políticos e sanções canónicas, estão agora a ser apresentados pela Santa Sé como os blocos de construção para uma abordagem pró-vida mais “sinodal”.

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O representante do Papa Francisco nos Estados Unidos apresentou uma estratégia alternativa sobre o aborto à que tem sido adoptada por alguns dos bispos do país. É uma mudança subtil que não anula nenhum ensinamento existente. No entanto, se colocada em prática, abriria um caminho pró-vida mais pastoral e menos politizado para a Igreja seguir.

Num discurso na reunião dos bispos em Baltimore na terça-feira, o arcebispo Christophe Pierre sublinhou o que descreveu como uma resposta “sinodal” ao aborto, que é menos focada em julgamentos e mais em como lidar com as causas profundas por trás das interrupções da gravidez.

“A Igreja deve ser assumidamente pró-vida. Não podemos abandonar a nossa defesa da vida humana inocente ou da pessoa vulnerável”, disse o arcebispo francês. Ainda assim, uma abordagem sinodal para a questão seria entender melhor o porquê de as pessoas procurarem interromper a gravidez; quais são as causas profundas das escolhas contra a vida e quais são os factores que tornam essas escolhas tão complicadas para alguns; e começar a formar um consenso com estratégias concretas para construir a cultura da vida e a civilização do amor”, referiu.

Por outras palavras: é tempo de parar de condenar e começar a ouvir. O arcebispo Pierre fez referência ao grupo “Caminhar com as mães necessitadas”, que oferece apoio prático às mães grávidas e aos seus filhos, enquanto exorta as paróquias a acompanhar com actos de bondade as mulheres que esperam bebés. Esta não é uma ideia nova. Há cerca de 25 anos, na Escócia, o cardeal Thomas Winning lançou uma iniciativa para apoiar as mulheres que enfrentavam uma gravidez de crise.

“Os gestos concretos, e não meras ideias, mostram o rosto maternal e terno da Igreja que é verdadeiramente pró-vida”, acrescentou D. Pierre.

O foco na pastoral-sinodal afastaria a Igreja de uma abordagem pró-vida centrada principalmente no aspecto jurídico e político.Procura impedir que a Igreja se envolva em guerras culturais e contrasta com os planos de alguns católicos conservadores que querem impedir o presidente Joe Biden, a Presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, e outros políticos católicos pró-escolha de receberem a Comunhão.

Em São Francisco, por exemplo, o arcebispo Salvatore Cordileone está a apoiar uma campanha passiva-agressiva que visa Pelosi. O arcebispo está a pedir aos católicos que rezem um rosário e que jejuem pela conversão da política. Por cada pessoa que o fizer, uma rosa será enviada à Presidente. Até agora, quase 16.000 católicos participaram. Pelosi, mãe de cinco filhos, já foi informada pelo seu arcebispo que ela não é bem-vinda a receber a Comunhão.

A posição de Biden e Pelosi está em desacordo com a doutrina da Igreja, que exige que os políticos católicos se oponham à legislação sobre o aborto. Mas o Papa Francisco, que se encontrou recentemente com o presidente Biden e a presidente Pelosi, não adoptou a abordagem de confronto de alguns bispos. O Papa teria dito a Biden para continuar a comungar e indicou que qualquer que seja a profundidade da discordância entre a igreja e os líderes políticos sobre o aborto, tornar a Eucaristia numa arma não pode ser a resposta.

A ênfase do arcebispo Pierre nas formas práticas e focadas na escuta para prevenir o aborto também apresenta alguns desafios. Negar a comunhão a políticos pró-escolha impediu um único aborto? O foco da causa pró-vida deveria ser gastar tempo e recursos em fazer lobby e campanha para derrubar leis, ou seria melhor gasto na construção de um consenso pró-vida?

Após a eleição do presidente Biden, os bispos têm debatido a questão da Eucaristia. O documento aprovado ontem à noite não impõe nenhuma sanção, mas lança um renascimento eucarístico de três anos que culminará com o Congresso Eucarístico Nacional de 2024 em Indianápolis.

O núncio Papal ofereceu agora uma hipótese para o movimento pró-vida apertar o botão de “reset” e mudar de direcção. Isto não diz respeito apenas aos Estados Unidos, mas também às igrejas em todo o mundo. O foco do Arcebispo Pierre na construção de uma “civilização do amor” baseia-se nos ensinamentos do Papa São João Paulo II encontrados na sua carta encíclica sobre questões pró-vida, a Evangelium Vitae. Nesse documento, o Papa polaco disse que “a Igreja está a par dos numerosos condicionalismos” por trás da decisão de uma mulher de fazer um aborto, mas exorta as mulheres que fizeram o aborto a não desanimarem ou perderem a esperança.

João Paulo II escreve: “o Pai de toda a misericórdia espera-vos para vos oferecer o seu perdão e a sua paz no sacramento da Reconciliação. A este mesmo Pai e à sua misericórdia, podeis com esperança confiar o vosso menino”.

Misericórdia e diálogo, em vez de duelos políticos e sanções canónicas, estão agora a ser apresentados pela Santa Sé como os blocos de construção para uma abordagem pró-vida mais “sinodal”.

 

Artigo de Christopher Lamb, publicado no The Tablet a 18 de Novembro de 2021.