Arquidiocese de Braga -

13 julho 2022

Na terra natal do Papa, os bispos dizem que as pessoas estão “famintas” em corpo e espírito

Fotografia AP Photo/Rodrigo Abd

DACS com Crux

Seis em cada 10 pessoas na Argentina foram pobres em algum momento da última década e trinta por cento dos argentinos não conheceram nada além da pobreza, de acordo com o relatório anual da Igreja Católica divulgado em Junho.

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Enquanto a Argentina natal do Papa Francisco se encontra à beira da hiperinflação e liderada por um presidente e uma vice-presidente em disputa pública, os bispos do país dizem que o povo está “faminto”, tanto em corpo quanto em espírito.

“Hoje a nossa pátria é um povo faminto, confuso, preocupado e ferido. Muitas famílias carecem do pão de cada dia e trabalho decente. A pobreza cresceu”, disse o arcebispo Carlos Alberto Sánchez, de Tucuman, no sábado, 9 de Julho.

“Há fome de justiça e dignidade, de respeito e cuidado com a vida em todas as suas etapas. Há fome de paz social, respeito pela constituição e democracia autêntica. Há fome de diálogo, encontro e participação para superar divisões e confrontos. Há uma fome de verdade, de uma educação que coloque a pessoa humana em primeiro lugar, que não imponha ideologias, que leve a pensar e a realizar-se com dignidade”, afirmou.

“Há uma fome de liberdade e de uma vida mais segura e cordial. Há uma fome de confiança e trabalho conjunto entre todos para o bem de todos. Há fome de esperança e consolação... Há fome de fraternidade e amor”, observou D. Sánchez.

As suas observações aconteceram no Dia da Independência da Argentina de Espanha. Como é costume, foi celebrado um Te Deum (ritual de agradecimento a Deus) na Catedral de Tucuman, cidade do Norte, onde em 1816 foi declarada a independência desta nação sul-americana.

Rompendo com a tradição, o presidente Alberto Fernandez não compareceu à cerimónia apesar de estar em Tucuman. Participou numa celebração oficial, mas quase não é visto em público desde a renúncia de Martin Guzmán, ex-ministro da Economia, a 2 de Julho.

Fernández e a sua vice-presidente, Cristina Fernández de Kirchner, estão em discordância pública há meses, e a renúncia de Guzmán é vista como uma vitória para a vice-presidente. No entanto, a sua substituição não conseguiu conquistar a confiança dos mercados. A economia aparece em queda livre, gerando medos e resultando em compras de pânico e aumentos rápidos de preços à medida que a taxa de câmbio informal dispara.

Kirchner, uma ex-presidente que continua a manter uma forte base de apoio apesar de enfrentar acusações no sistema de justiça da Argentina por corrupção, má gestão e apropriação indevida de fundos públicos, seleccionou Fernández, que não tinha influência política para a sua própria candidatura, para liderar a corrida com ela como vice-presidente pouco antes das eleições de 2019.

A aliança foi forjada para derrotar o presidente de centro-direita Mauricio Macri. No entanto, a ténue união rapidamente começou a azedar e, nos últimos meses, as tensões tornaram-se públicas, com Kirchner a criticar abertamente Fernández em discursos públicos à medida que o país continua a deteriorar-se.

Seis em cada 10 pessoas na Argentina foram pobres em algum momento da última década e trinta por cento dos argentinos não conheceram nada além da pobreza, de acordo com o relatório anual da Igreja Católica divulgado em Junho.

O bispo Oscar Ojea, de San Isidro, e presidente da Conferência Episcopal Argentina, aproveitou o dia 9 de Julho para reflectir sobre os problemas económicos do país e também sobre aquilo a que chamou de “verdadeira crise política”.

D. Ojea disse que é preciso coragem para superar as divisões da sociedade, ainda mais se a Argentina quiser deter os milhares de jovens que querem fugir do país em busca de melhores oportunidades e estabilidade económica.

“Quando podemos aprender a apoiar quem precisa, estamos a construir a pátria. Não me refiro à pátria como extensão territorial, ou como consenso de vontades a que chamamos de «nação», mas aquela pátria que tem que ver com a raiz de uma nova história. Para isso, temos de ter muita coragem, muita decisão, muita audácia e muita criatividade – e principalmente, neste momento, liderança”, disse D. Ojea.

Artigo de Inés San Martín, publicado no Crux a 10 de Julho de 2022.